domingo, 4 de maio de 2014

Luiz Carlos Costa: SP. Por um Plano Diretor mais sensato

Folha de São Paulo



Apesar das inúmeras contestações técnicas e jurídicas, o novo projeto de Plano Diretor Estratégico de São Paulo foi aprovado em primeira votação pela Câmara Municipal. No entanto, é preciso ter presente que os problemas mais graves não foram resolvidos. Alguns dispositivos podem trazer gravíssimas consequências à sociedade e à cidade. 

Entre eles, destaca-se a autorização conferida ao setor imobiliário para expandir indefinidamente seus empreendimentos verticalizados e elitistas em uma imensa parcela do território urbano, independentemente de sua capacidade de suporte. Reproduzirá, assim, o processo que na última década invadiu indiscriminadamente os bairros da cidade, gerando efeitos desastrosos em termos de congestionamento, expulsão das populações de menor renda, deterioração de condições ambientais ou desestruturação de bairros que são patrimônio das coletividades neles instaladas. 

Essa autorização será feita agora sem que seja condicionada à produção concomitante da infraestrutura, equipamentos e serviços públicos que atenderiam às demandas criadas. Tampouco será condicionada ao planejamento urbano rigoroso e democrático que atenderia em cada região e bairro às necessidades e aspirações dos cidadãos e comunidades atingidas. 

Outra proposição inaceitável do projeto é a criação de faixas urbanas adensadas na contiguidade das estações do metrô e trens urbanos e de novos corredores exclusivos de ônibus sem que se demonstre que esses sistemas de transportes, notoriamente saturados, terão capacidade de atender às demandas atuais e as decorrentes do adensamento planejado. Ou sem que se demonstre que a implantação automática das faixas adensadas com padrões excepcionais não causaria impactos inaceitáveis sobre os bairros e sobre seu desenvolvimento planejado. 

Por outro lado, é indispensável que o plano de estruturação de toda a cidade, hoje apresentado de forma vaga e incompleta, defina um sistema competente e viável de transportes públicos. Ele deve assegurar que as demandas de viagens sejam atendidas em prazo determinado. E deve servir de base para o cálculo de potenciais construtivos adequados às diferentes partes do território, elemento indispensável à futura lei de uso do solo. 

Inúmeros especialistas reclamam que o projeto em sua forma atual está longe de poder orientar com base técnica as diferentes políticas urbanas que só o PDE pode definir de forma coerente, realista e eficaz. As políticas são necessárias para atender às legitimas e urgentes demandas da sociedade, particularmente quanto à mobilidade urbana, habitação popular, equipamentos públicos e sustentabilidade ambiental. 

Não há por que aprovar imediatamente o contestado projeto substitutivo, quando é possível chegar, com algum esforço adicional, a diretrizes satisfatórias e dar segurança a todos os cidadãos e agentes envolvidos no processo. 

Assim sendo, não parece existir outra solução para a condução responsável do PDE senão a programação cuidadosa de um período complementar do trabalho coletivo que assegure que as críticas e sugestões sejam consideradas seriamente e decididas da forma participativa exigida pela Constituição. 

LUIZ CARLOS COSTA, 78, é professor aposentado de planejamento urbano da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, membro titular do Conselho Municipal de Política Urbana e diretor do Movimento Defenda São Paulo

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