Manifestação ocorre ao mesmo tempo
em que deputados federais debatem PEC 215 no Legislativo paulista.
Índios são contra levar ao Congresso palavra final sobre novas terras
Guaranis ocupam Monumento às Bandeiras pela segunda vez em menos de um ano contra mudanças na demarcação
São Paulo – Acompanhados por integrantes do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), do Movimento Passe
Livre (MPL) e do Comitê Popular da Copa, cerca de 150 guaranis de
aldeias localizadas na cidade de São Paulo voltaram às ruas na tarde de
hoje (6) para protestar contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
215.
Apresentado em 2000, o texto pretende retirar do governo federal a prerrogativa de demarcar terras indígenas no país.
Os índios começaram a se concentrar nos arredores da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo por volta das 14h. O local foi escolhido porque, neste mesmo horário, a Comissão Especial sobre Demarcação de Terras Indígenas da Câmara dos Deputados conduzia no Palácio Nove de Julho uma conferência para discutir a PEC 215, a oitava realizada no país desde setembro de 2013, quando o grupo foi criado.
Os guaranis, porém, não quiseram participar do debate: se limitaram a marchar pelos arredores do parlamento paulista com suas faixas e cantos tradicionais.
"Preferimos dialogar com a sociedade, e não com os ruralistas", revelou Marcos Tupã, liderança da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), organização política que congrega guaranis do Sul e Sudeste do país.
Além do arquivamento da PEC 215, as mensagens que os índios levaram às ruas pediam a demarcação das duas terras indígenas que ficam em São Paulo: a Terra Indígena Tenondé Porã, na zona sul da cidade, e a Terra Indígena do Jaraguá, na zona norte, que, com apenas 1,7 hectare para abrigar 800 guaranis, é a menor área de ocupação indígena do Brasil.
Ambas já tiveram seus relatórios antropológicos aprovados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) há mais de um ano, e esperam a assinatura do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, declarando os territórios como áreas de ocupação tradicionais passíveis de demarcação pela Presidência da República.
Por isso, durante o protesto, os guaranis carregaram bonecos de Cardozo com os dizeres "Ministro que perdeu a caneta", em referência ao que consideram uma demora em assinar a portaria declaratória.
A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), os deputados federais Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Paulo César Quartieiro (PSD-RR) também foram hostilizados – e acabaram malhados feito Judas, com pontapés e flechas.
No final, após ocuparem simbolicamente o Monumento às Bandeiras, os quatro bonecos foram queimados.
O rosto de outros políticos considerados "inimigos" da questão indígena, como Luiz Carlos Heinze (PP-RS), Alceu Moreira (PMDB) e o sojicultor Blairo Maggi, acabaram servindo de máscaras para os bandeirantes retratados na escultura modernista de Victor Brecheret.
Assim, os guaranis materializaram um dos principais slogans da manifestação:
"Bandeirantes de ontem, ruralistas de hoje", uma vez que comparam o massacre indígena promovido pelos desbravadores paulistas à expansão do agronegócio – que, dizem, está acabando com a cultura indígena.
Dentro da Assembleia Legislativa, cerca de 30 pessoas assistiram à conferência sobre a PEC 215, entre elas os deputados federais Junji Abe (PSD-SP), membro da Comissão Especial sobre Demarcações de Terras Indígenas, e Osmar Serraglio (PMDB-PR), relator da proposta na Câmara. "Precisamos de novos instrumentos para controlar o trabalho da Funai", defendeu Serraglio à RBA após sua intervenção na conferência. "Pensamos que essa tarefa pode ser desempenhada pelo Congresso. O Executivo faria tudo o que tem que fazer e, no final, assim como acontece com as concessões de rádio e televisão, ouve o Congresso, que representa o povo brasileiro."
O deputado afirma, porém, que esse não é o único caminho proposto pelos parlamentares favoráveis às mudanças no processo demarcatório.
"Se a transferência dessa prerrogativa ao Legislativo criar muitas dificuldades, até porque o governo federal é contra, tudo bem: o importante é que acha uma instância externa à Funai", pontua, considerando irrelevante o prazo dado pelo órgão indigenista para contestações dos territórios passíveis de demarcação. "Quem protege os indígenas não pode julgar os processos relativos aos índios."
Os guaranis que vivem nas aldeias de São Paulo discordam radicalmente. Ao contrário do deputado, denunciam que o Congresso conta com presença majoritária de parlamentares comprometidos com os interesses do agronegócio – e que transferir ao Legislativo a palavra final sobre demarcações enterraria a possibilidade de que novas aldeias sejam definidas no país.
"A PEC 215 também abre possibilidade de que os parlamentares revejam os limites das terras indígenas e reduzam suas dimensões", lembra Marcos Tupã, liderança da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), organização que congrega guaranis do Sul e Sudeste.
"Hoje eles estão discutindo a proposta aqui na Assembleia Legislativa, uma proposta que contraria o artigo 231 da Constituição e que vai dificultar cada vez mais as demarcações. Viemos mostrar ao povo que somos contra."
"A princípio, apoiamos incondicionalmente os indígenas na reconquista de seus territórios", explica Michel Navarro, membro da regional Grande São Paulo do MST, justificando a presença do movimento camponês ao lado dos guaranis.
"Agora a bancada ruralista está viajando pelo Brasil, com audiências públicas, tentando angariar apoio para aprovar a PEC 215. Sabemos que a bancada ruralista é a mais forte do Congresso e que na realidade o que querem é avançar sobre os territórios indígenas."
Para Navarro, o avanço do agronegócio sobre as terras indígenas e quilombolas do país é uma das características do modelo econômico impulsionado pelo governo federal, e que o MST classifica como neodesenvolvimentista.
"É a manutenção do Brasil como um país exportador de riquezas e a apropriação desenfreada do capital sobre os recursos naturais", define. "Nossos assentamentos também sofrem com isso."
Apresentado em 2000, o texto pretende retirar do governo federal a prerrogativa de demarcar terras indígenas no país.
Os índios começaram a se concentrar nos arredores da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo por volta das 14h. O local foi escolhido porque, neste mesmo horário, a Comissão Especial sobre Demarcação de Terras Indígenas da Câmara dos Deputados conduzia no Palácio Nove de Julho uma conferência para discutir a PEC 215, a oitava realizada no país desde setembro de 2013, quando o grupo foi criado.
Os guaranis, porém, não quiseram participar do debate: se limitaram a marchar pelos arredores do parlamento paulista com suas faixas e cantos tradicionais.
"Preferimos dialogar com a sociedade, e não com os ruralistas", revelou Marcos Tupã, liderança da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), organização política que congrega guaranis do Sul e Sudeste do país.
Além do arquivamento da PEC 215, as mensagens que os índios levaram às ruas pediam a demarcação das duas terras indígenas que ficam em São Paulo: a Terra Indígena Tenondé Porã, na zona sul da cidade, e a Terra Indígena do Jaraguá, na zona norte, que, com apenas 1,7 hectare para abrigar 800 guaranis, é a menor área de ocupação indígena do Brasil.
Ambas já tiveram seus relatórios antropológicos aprovados pela Fundação Nacional do Índio (Funai) há mais de um ano, e esperam a assinatura do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, declarando os territórios como áreas de ocupação tradicionais passíveis de demarcação pela Presidência da República.
Por isso, durante o protesto, os guaranis carregaram bonecos de Cardozo com os dizeres "Ministro que perdeu a caneta", em referência ao que consideram uma demora em assinar a portaria declaratória.
A senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), os deputados federais Ronaldo Caiado (DEM-GO) e Paulo César Quartieiro (PSD-RR) também foram hostilizados – e acabaram malhados feito Judas, com pontapés e flechas.
No final, após ocuparem simbolicamente o Monumento às Bandeiras, os quatro bonecos foram queimados.
O rosto de outros políticos considerados "inimigos" da questão indígena, como Luiz Carlos Heinze (PP-RS), Alceu Moreira (PMDB) e o sojicultor Blairo Maggi, acabaram servindo de máscaras para os bandeirantes retratados na escultura modernista de Victor Brecheret.
Assim, os guaranis materializaram um dos principais slogans da manifestação:
"Bandeirantes de ontem, ruralistas de hoje", uma vez que comparam o massacre indígena promovido pelos desbravadores paulistas à expansão do agronegócio – que, dizem, está acabando com a cultura indígena.
Dentro da Assembleia Legislativa, cerca de 30 pessoas assistiram à conferência sobre a PEC 215, entre elas os deputados federais Junji Abe (PSD-SP), membro da Comissão Especial sobre Demarcações de Terras Indígenas, e Osmar Serraglio (PMDB-PR), relator da proposta na Câmara. "Precisamos de novos instrumentos para controlar o trabalho da Funai", defendeu Serraglio à RBA após sua intervenção na conferência. "Pensamos que essa tarefa pode ser desempenhada pelo Congresso. O Executivo faria tudo o que tem que fazer e, no final, assim como acontece com as concessões de rádio e televisão, ouve o Congresso, que representa o povo brasileiro."
O deputado afirma, porém, que esse não é o único caminho proposto pelos parlamentares favoráveis às mudanças no processo demarcatório.
"Se a transferência dessa prerrogativa ao Legislativo criar muitas dificuldades, até porque o governo federal é contra, tudo bem: o importante é que acha uma instância externa à Funai", pontua, considerando irrelevante o prazo dado pelo órgão indigenista para contestações dos territórios passíveis de demarcação. "Quem protege os indígenas não pode julgar os processos relativos aos índios."
Os guaranis que vivem nas aldeias de São Paulo discordam radicalmente. Ao contrário do deputado, denunciam que o Congresso conta com presença majoritária de parlamentares comprometidos com os interesses do agronegócio – e que transferir ao Legislativo a palavra final sobre demarcações enterraria a possibilidade de que novas aldeias sejam definidas no país.
"A PEC 215 também abre possibilidade de que os parlamentares revejam os limites das terras indígenas e reduzam suas dimensões", lembra Marcos Tupã, liderança da Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), organização que congrega guaranis do Sul e Sudeste.
"Hoje eles estão discutindo a proposta aqui na Assembleia Legislativa, uma proposta que contraria o artigo 231 da Constituição e que vai dificultar cada vez mais as demarcações. Viemos mostrar ao povo que somos contra."
"A princípio, apoiamos incondicionalmente os indígenas na reconquista de seus territórios", explica Michel Navarro, membro da regional Grande São Paulo do MST, justificando a presença do movimento camponês ao lado dos guaranis.
"Agora a bancada ruralista está viajando pelo Brasil, com audiências públicas, tentando angariar apoio para aprovar a PEC 215. Sabemos que a bancada ruralista é a mais forte do Congresso e que na realidade o que querem é avançar sobre os territórios indígenas."
Para Navarro, o avanço do agronegócio sobre as terras indígenas e quilombolas do país é uma das características do modelo econômico impulsionado pelo governo federal, e que o MST classifica como neodesenvolvimentista.
"É a manutenção do Brasil como um país exportador de riquezas e a apropriação desenfreada do capital sobre os recursos naturais", define. "Nossos assentamentos também sofrem com isso."
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