Artigo no Alerta
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Por Pedro Dória
Em fevereiro, a
comentarista e âncora do telejornal SBT Brasil Rachel Sheherazade se tornou uma
das mais conhecidas personagens das redes sociais. “No país que ostenta
incríveis 26 assassinatos a cada 100 mil habitantes”, disse no ar, “a atitude
dos vingadores é até compreensível.”
Referia-se aos justiceiros cariocas que acorrentaram um adolescente de rua negro contra um poste, pelo pescoço, com uma tranca de bicicleta. Qual fora escravo. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) pediu investigação à Procuradoria Geral da República. O Sindicato de Jornalistas do Rio publicou nota de repúdio. No início de abril, quando Sheherazade saiu de férias, circulou pela imprensa o rumor de que havia sido afastada pela emissora por pressão do governo. Houve quem celebrasse. É um erro.
Referia-se aos justiceiros cariocas que acorrentaram um adolescente de rua negro contra um poste, pelo pescoço, com uma tranca de bicicleta. Qual fora escravo. A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) pediu investigação à Procuradoria Geral da República. O Sindicato de Jornalistas do Rio publicou nota de repúdio. No início de abril, quando Sheherazade saiu de férias, circulou pela imprensa o rumor de que havia sido afastada pela emissora por pressão do governo. Houve quem celebrasse. É um erro.
Sheherazade é um
fenômeno da internet que provavelmente não ganharia tanto espaço noutros
tempos. A baixa audiência de seu telejornal é compensada por inúmeras cópias de
seus comentários, quase sempre inflamatórios, no YouTube. Muitos a defendem.
Assim como muitos por ela sentem repugnância. A jornalista não faz concessões ao bom gosto: é uma radical. Mas liberdade de expressão jamais é testada pelos razoáveis, pelos moderados, pelos de bom gosto.
Assim como muitos por ela sentem repugnância. A jornalista não faz concessões ao bom gosto: é uma radical. Mas liberdade de expressão jamais é testada pelos razoáveis, pelos moderados, pelos de bom gosto.
O principal
argumento contra Sheherazade parece partir do bom senso: faz apologia ao crime.
Parece bom senso. Não é. Apologia ao crime é dos argumentos mais perigosos que
se pode levantar contra a opinião de alguém. Há quem defenda o livre fumo de
maconha. É crime.
O aborto tem defensores. Igualmente crime. Defende-se a ocupação de propriedade privada por quem precisa de moradia e não a tem. Crimes todos. As duas primeiras defesas não costumam incomodar quem é liberal ou de esquerda. A última raramente perturba a esquerda. Considerar alguns crimes defensáveis ou não tem a ver com ideologia, não com o que é razoável. Nossa ideologia, claro, sempre nos parece razoável. O inferno são os outros.
O aborto tem defensores. Igualmente crime. Defende-se a ocupação de propriedade privada por quem precisa de moradia e não a tem. Crimes todos. As duas primeiras defesas não costumam incomodar quem é liberal ou de esquerda. A última raramente perturba a esquerda. Considerar alguns crimes defensáveis ou não tem a ver com ideologia, não com o que é razoável. Nossa ideologia, claro, sempre nos parece razoável. O inferno são os outros.
Há um excelente
argumento para permitir que Sheherazade fale, por mais desagradáveis que possam
ser suas opiniões. Ela representa um pedaço do Brasil. Basta passar os olhos
pelas discussões na rede. Um bom naco dos brasileiros vai para além do
conservadorismo: é reacionário. Talvez seja aquele quarto da população que,
segundo o Ipea, considera que a roupa da mulher justifica o estupro. Seus
representantes talvez sejam os que defendem abertamente os justiceiros ou fazem
justiçamentos. Este é um pedaço do Brasil. Se calamos uma voz que “os
compreende”, desligamos um alerta. Sem este alerta, desaparecem as vozes e os
argumentos contra.
Thomas Jefferson,
cuja data de nascimento foi celebrada domingo, disse que “a liberdade de
expressão não pode ser limitada sem ser perdida”. Os EUA, país que ajudou a
fundar, têm a legislação mais incisiva na defesa da livre expressão. Não quer
dizer que seja absoluta. Mas que, antes de punir o discurso, pesam se vale o
risco. Porque, a não ser que os critérios para punir o discurso sejam
extremamente rigorosos, fica fácil demais. E a censura se estabelece.
Incitação ao crime
é critério para punir a fala. Mas é preciso provar que um crime ocorreu causado
por ela. Uma coisa é desejar a morte de alguém numa conversa de bar. Outra é clamar
pela morte da pessoa, em frente a sua casa, perante uma turba em fúria. Não se
pune a mensagem. Punem-se os efeitos concretos da mensagem.
Pode não parecer intuitivo, mas é só quando garantimos o livre discurso dos mais radicais em uma sociedade, à direita e à esquerda, que realmente expomos seus vícios. Só assim somos realmente livres. A internet é uma máquina de livre expressão. Que seja amplamente usada.
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