O pedido de quebra de sigilo de
celulares do Palácio do Planalto feito à Justiça por uma promotora do Distrito
Federal atinge também os aparelhos usados em dois outros Poderes da República:
o Supremo Tribunal Federal e o Congresso Nacional. As antenas localizadas na região
apontada como alvo pelo Ministério Público cobrem toda a área da praça dos Três
Poderes, na região central de Brasília, que abriga as sedes do Executivo, do
Legislativo e do Judiciário.
A promotora Márcia Milhomens
Sirotheau Corrêa encaminhou a solicitação de rastreamento à Vara de Execuções
Penais do Distrito Federal em 27 de fevereiro, no escopo da investigação sobre
o suposto uso de um telefone celular na prisão pelo ex-ministro José Dirceu. Condenado pelo STF no processo do
mensalão, Dirceu está preso desde novembro no Complexo Penitenciário da Papuda,
em Brasília. Técnicos da Anatel (Agência
Nacional de Telecomunicações) confirmaram à Folha o alcance do pedido dela.
Em seu requerimento, a promotora
apontou duas coordenadas geográficas sem indicar a que áreas correspondiam. Uma
é a da Papuda e a outra cai diretamente no Planalto, onde a presidente Dilma
Rousseff despacha. Ao tomar conhecimento da extensão
do pedido, o governo reagiu imediatamente e entrou anteontem com a reclamação
disciplinar contra a promotora na Corregedoria do Conselho Nacional do
Ministério Público. O órgão tem o poder de avaliar a conduta de seus
integrantes.
A AGU (Advocacia-Geral da União),
órgão que representa juridicamente o governo federal, critica a solicitação
"ampla, geral e irrestrita, sem qualquer explicação". Na reclamação disciplinar, à qual
a Folha teve acesso, a AGU afirma que a quebra, se autorizada, configuraria uma
"verdadeira devassa" de todos os Poderes da República. O órgão diz, no mesmo documento,
que as estações de rádio base que captam sinais de celulares usados no Palácio
do Planalto são as mesmas que cobrem o Congresso Nacional e o STF. Milhomens pediu para rastrear as
ligações feitas entre os dias 1º e 16 de janeiro deste ano. Ela reafirmou
ontem, por meio de sua assessoria, que só se manifestará sobre o caso nos autos
do processo.
ALCANCE
Segundo a Folha apurou, a quebra
do sigilo poderia listar ligações de deputados, senadores, ministros de Estado
e até mesmo da cúpula do Ministério Público, instituição da própria promotora
Márcia Milhomens, cuja sede fica a cerca de um quilômetro da praça dos Três
Poderes. O rastreamento, mesmo com
coordenadas específicas, poderia incluir ainda outros locais próximos, como a
Catedral de Brasília e o Tribunal de Contas da União. Ou seja: pessoas comuns que
fizeram ligações na região do Palácio do Planalto poderiam ser atingidas.
O requerimento da promotora pedia
que operadoras de telefonia informassem as ligações efetuadas e recebidas, nas
áreas indicadas, por meio das estações de rádio base --antenas usadas para
chamadas que envolvem celulares. Especialistas em telecomunicações
ouvidos pela Folha estimam que cada antena abrange sinal em um raio médio de
quatro quilômetros. Por isso, o pedido, da forma como foi feito, atinge toda a
praça dos Três Poderes.
Para o governo, segundo a
reclamação da AGU, a promotora adotou um "procedimento inteiramente
inédito e heterodoxo" em sua apuração. O documento, assinado pelo
ministro da pasta, Luís Inácio Adams, afirma que se trata de uma
"aparentemente insólita iniciativa de obter os dados sigilosos". O Supremo Tribunal Federal tem se
manifestado contrariamente a quebras de sigilo baseadas em pedidos com
formulações genéricas.(Folha de São Paulo)
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