O GLOBO - 01/05
Quem melhor definiu a situação em que se encontra o PT e
partidos da base aliada foi o ministro Ricardo Berzoini, um membro
destacado da burocracia partidária: a campanha pela volta de Lula não tem
sentido prático, disse ele, à guisa de defender a candidatura da presidente
Dilma à reeleição.
Sintomático que a melhor coisa que ele pudesse dizer fosse
isso, apelando para o pragmatismo de seus correligionários. Nenhum elogio ao
governo Dilma, nem mesmo um comentário sobre eventuais qualidades. "Ela
tem o direito de se candidatar", disse Berzoini, e cabe ao PT lidar com
essa realidade. Mesmo que esteja coberto de razão, a fala
do ministro de Relações Institucionais demonstra como estão se
estreitando as chances de Dilma na campanha. Para aliados circunstanciais, a
maioria dos partidos que fazem parte da coalizão, esse argumento prático não
encerra o assunto, ao contrário, reforça a sensação de que é preciso procurar
uma alternativa longe do PT.
Mesmo que a maioria dos petistas não queira Dilma, não há
outra escolha a não ser seguir com ela até o fim, mesmo para perder (e ela tem
boas chances de vencer: com a caneta cheia de tinta, abriu ontem seu saco de
bondades, que ajudará sua popularidade e aumentará mais ainda os problemas
econômicos do país). Se a alternativa for Lula, dificilmente se tornará
realidade. Em primeiro lugar, existe a necessidade de Dilma aprovar a troca, o
que parece improvável. Ao anunciar que será candidata mesmo sem apoio da base,
Dilma pode ter cometido um erro político, revelando fragilidade, mas mostrou
que tirá-la do páreo não será fácil.
Dilma também, espertamente, ressaltou a lealdade que
existiria entre ela e Lula, o que coloca uma outra barreira ao golpe partidário
que pretendem dar. Lula teria que assumir uma traição à sua criatura, o que,
convenhamos, não seria bom para sua imagem. Uma solução de ruptura tampouco
seria uma boa saída para o PT, pois teria de passar a campanha inteira
justificando o golpe em Dilma, que, por sinal, estará no Planalto com a caneta
na mão e cheia de ressentimento.
A substituição por motivos de saúde seria a única saída, mas
nada indica que Dilma tenha problemas, e seria impossível conseguir o aval de
médicos respeitados do hospital Sírio-Libanês para encobrir a manobra golpista.
Falta sentido prático ao "Volta, Lula", além de
faltar vontade ao principal personagem desse "golpe branco", o
próprio ex-presidente. Não diria que, se pudesse voltar à Presidência sem
passar por eleições, que ele não gostaria. Mas disputar uma eleição difícil, em
condições anormais como as criadas pelo afastamento de Dilma, seria mais que um
risco.
Só a substituição de candidatos já seria uma admissão de
fracasso, e uma tendência de derrota que teria de ser superada pelo
"craque" do time, tirado do banco de reservas. Mesmo para um
"craque" como Lula, seria difícil reverter uma derrota iminente.
Longe dos melhores dias, seja pela idade ou pelos problemas de saúde que
superou, Lula dificilmente teria condições de enfrentar uma campanha estafante
como a que se avizinha. Teria de confiar em seu magnetismo e no tempo de TV,
mas levar em conta que hoje está mais vulnerável a críticas do que esteve.
Superar a crise do mensalão foi possível, em especial, pela
situação econômica em 2006. Hoje temos uma economia debilitada e perspectiva de
um 2015 difícil, que exigirá do eleito esforço para restabelecer o equilíbrio
às contas públicas e controlar a inflação. Tarefa que Lula enfrentou 12 anos
atrás. Estará disposto a arriscar duplamente seu prestígio e sua história,
disputando uma eleição difícil e depois encarando um mandato que tem tudo para
impedir que repita o sucesso dos 8 anos em que governou? Como sempre quando improvisa,
Dilma fez uma declaração entre a obviedade e o enigmático: "Sempre, por
trás de todas as coisas, existem outras explicações".
Referia-se às traições que se desenham às suas costas, no PT
e na base. O que quer dizer a presidente? Certamente o que não pode aprofundar
por falta de condições políticas, que os que a estão abandonando o fazem por
interesses fisiológicos, que ela rejeita. Esta seria boa linha de atuação, se
Dilma tivesse condições de romper com aliados de circunstâncias e anunciar um
2º mandato livre de interesses subalternos. Foi o que ensaiou com a
"faxina ética", e teve de voltar atrás.
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