Modalidade nova, a chamada creche oferece atividades em meio período ou turno integral
luana.lopes@jornaldebrasilia.com.br
São muitas histórias e perdas pelo caminho. A velhice é um processo natural, que chega repleto de limitações. Com a rotina de trabalho, estudo e filhos, os parentes ficam sem saber qual a melhor opção para cuidar bem do familiar. As instituições de longa permanência, os asilos, são encarados muitas vezes como uma forma de abandono. A sociedade e o mercado, entretanto, se adaptam para encontrar alternativas: eis que surge a “creche para idosos”.
A proposta desta modalidade recente é oferecer uma solução aos familiares que não possuem tempo ou condições de cuidar de idosos e não querem a separação.
Há três meses frequentando a creche no período da tarde, Elisa Fraga se orgulha por ainda ter disposição em “ajudar” os monitores. Aos 94 anos, ela é a mais velha do grupo.
Mesmo com o corpo curvado pela idade e se apoiando nos móveis e portais para se locomover, dona Elisa não tem empecilhos para participar de diversas tarefas.
Durante a Copa do Mundo, por exemplo, ela participou da confecção de na bandeirinhas com as cores do Brasil para enfeitar o espaço. “Eu brinco, pulo e conto piadas. Se deixarem, eu ajudo até a varrer o chão”, garante.
Elisa tem dois filhos. Apaixonada por Pirapora (MG), cidade que morou grande parte da vida, ela não se acostumou a viver em Brasília. A filha Maria Lúcia, 72 anos, relata que a mãe sempre teve muitos amigos no local onde vivia. A separação misturada com a nova rotina na capital fez com que Elisa se sentisse sozinha. “Ela sente falta de caminhar pela cidade e reclamava quando ficava presa em casa”, diz.
Centro do dia
A idosa frequenta a Singular Espaço Sênior, em Taguatinga. Pioneiro no DF, o espaço tem menos de um ano. Seguindo o modelo de instituições de São Paulo e Curitiba, Adriana Paiva, Lis Alecrim e Ana Paula Soares abriram o centro com o objetivo de criar um espaço de convivência agradável, com atividades para a terceira idade.
No início, elas preferiam não utilizar o termo “creche” para não infantilizar os idosos, mas com o tempo viram a necessidade de colocar a placa na frente do local. “A gente teve que se adaptar para mostrar à população que existe esse serviço e que está próximo deles”, relata Ana Paula.
Acompanhamento profissional
Na casa de paredes amarelas, cerca de dez idosos participavam do
momento da fisioterapia acompanhados por uma música que incentivava a
movimentar os braços e pernas. No período que passam no local, tanto os
que moram lá quanto os que ficam apenas durante o dia participam de
diversas atividades. Além da fisioterapia, também possuem musicoterapia e
atividades de terapia ocupacional, como pintura, por exemplo.
Passeios são aguardados
Atualmente, oito pessoas moram no Singular Espaço Sênior e cinco
passam o dia, sempre com a supervisão de dois técnicos de enfermagem e
três estagiários por plantão. As fundadoras, todas especializadas em
gerontologia, afirmam que as famílias, depois da experiência, reconhecem
que um espaço de convivência é mais adequado do que contratar um
cuidador, principalmente pela interação que acontece entre os idosos.
Entre as atividades oferecidas, o que mais anima os idosos são
as saídas. Uma vez por mês, uma van busca o grupo para que eles visitem
parques, assistam peças de teatro e passeiem pela cidade.
Em março deste ano, um evento causou uma comoção especial em Pedro
Cruz, de 85 anos, que mora no Espaço Sênior desde o início do ano. Ao
assistir ao musical Gonzagão – A Lenda, Pedro revelou que era amigo
íntimo de Luiz Gonzaga e que, por muitos anos, acompanhou os shows do
Rei do Baião. “Lembrei de muitas coisas do passado”, relata.
Interação social evita sintomas depressivos
Uma pesquisa feita em 2013 por uma estudante da Escola de
Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP), da Universidade de São Paulo,
apontou que a falta de atividades sociais e físicas na fase de
envelhecimento pode levar os idosos à solidão, tristeza e alteração de
humor. Para a médica Maria Alice Toledo, especializada em geriatria e
professora da Universidade de Brasília, a depressão é um dos sintomas
mais frequentes entre idosos que não possuem ocupação. “As atividades
físicas e interação social são pilares para um envelhecimento sadio”,
afirma.
No caso da idosa Elisa Fraga, 93 anos, a decisão da família de
deixá-la na instituição de Taguatinga veio quando eles perceberam a
necessidade de estimular o contato social nessa fase de limitações.
Apesar da idade avançada, dona Elisa garante que não tem problemas de
saúde. “Nunca fiquei em hospital”, assegura. A filha Maria Lúcia
confirma a informação, mas revela que a mãe não aceita tomar
medicamentos, mesmo quando precisa bastante.
Memória
De acordo com a geriatra Maria Alice, a interação social com outros
idosos e também com jovens estimula a parte lúdica. “Quanto mais baixa a
estimulação social e física, mais propensos eles ficam a ter problemas
de memória”, afirma.
Para os filhos da dona Elisa, a creche fez com que a mãe se
sentisse menos sozinha. “Ela fez novos amigos e tem com quem conversar.
Isso faz bem pra ela”, reconhece a filha Maria Lúcia.
Companhia
A convivência com outras pessoas na mesma condição também pode ser
um suporte para enfrentar dificuldades. Everaldo Cunha, de 62 anos,
sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC) em 2010. Em uma cadeira de
rodas desde então, ele divide o tempo na “creche” de Taguatinga entre
leituras e conversas com os colegas. “Aqui eu não fico sozinho”,
alegra-se. Everaldo era um dos mais animados durante a sessão de
fisioterapia, atividade que treina pontos como o equilíbrio e mantém
funcionalidades.
Onde se pode encontrar lazer
O último Censo feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) apontou que no Distrito Federal há mais de 198 mil
residentes com mais de 60 anos – 7,7% da população. E quando chega a
terceira idade, embora seja maior o tempo que pode ser dedicado ao
lazer, nem todos descobrem formas de se divertir. No DF, eles possuem a
opção de participar dos grupos de idosos.
Atualmente, apenas oito centros de convivência estão cadastrados
na Secretaria Especial do Idoso (SEI-DF) e 16 estão em processo de
registro. Eles estão espalhados por Brasília, Candangolândia,
Brazlândia, Ceilândia, Gama e Cruzeiro. Todos os meses uma das
associações é escolhida para receber os programas da secretaria, que
envolvem passeios turísticos e culturais e sessões gratuitas de cinema.
Exercícios
Os idosos do DF também podem praticar atividades nos centros de
convivência e centros olímpicos da cidade, de acordo com a
disponibilidade dos locais.
Segundo a geriatra Maria Alice Toledo, pesquisas sobre a chamada
“medicina preventiva” apontam que o exercício físico é a melhor opção
para retardar o envelhecimento, pois ajuda a melhorar a oxigenação e
previne as fraturas e atrofias. “As atividades físicas deixam o idoso
mais independente”, completa a especialista.
Saiba mais
No DF, as projeções para 2020 e 2030 indicam um envelhecimento
populacional com a proporção de idosos chegando a 13,7% e 18,7%,
respectivamente.
Em 2010, a expectativa de vida era de 72,4 anos para homens e de 79,8 anos para elas.
Essa média deve aumentar para 76,2 anos e 83 anos, respectivamente.
Serviço
Singular Espaço Sênior
Endereço: QNA 56 lote 10 - Taguatinga Norte
Telefone: 3536-0727
Fonte: Da redação do Jornal de Brasília
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