29/04/2014
às 4:57
Todo mundo
sabe que os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa,
do Supremo Tribunal Federal, não formam exatamente uma “corrente” de
pensamento. Ainda bem que não! Tribunal não é seita nem ideológica nem
partidária. Eles estão lá para, instruídos pela Constituição e pelas
leis, julgar de acordo com a sua consciência.
Nem devem prestar atenção
nem ao alarido das ruas nem aos bochichos de corredores. Só que Luiz
Inácio Lula da Silva, que supõe encarnar em si mesmo os Poderes
Executivo, Legislativo e Judiciário, não se conforma com isso. Nesta
segunda, esses três ministros afinaram suas vozes para reagir aos
ataques que Lula desfechou contra o STF.
Em
entrevista ao programa “Os Pingos nos Is”, que estreou ontem, às 18h,
na rádio Jovem Pan, Mendes comentou a declaração de Lula, segundo quem o
julgamento do mensalão foi “80% político e 20% jurídico”. Disse Mendes:
“O tribunal se debruçou sobre esse tema já no recebimento da denúncia.
Depois, houve várias considerações técnicas; houve rejeição da denúncia
em muitos pontos; houve toda uma instrução processual, e o tribunal
julgou com clareza e examinou todas essas questões”.
O ministro
está afirmando, em suma, que se fez um julgamento técnico. Joaquim
Barbosa, presidente do Supremo, também reagiu: “O juízo de valor emitido
pelo ex-chefe de estado não encontra qualquer respaldo na realidade e
revela pura e simplesmente sua dificuldade em compreender o
extraordinário papel reservado a um Judiciário independente em uma
democracia verdadeiramente digna desse nome”.
Pois é…
Este é o ponto: Lula não se conforma que a Justiça não ceda às injunções
da política — e, claro!, da sua política. Ora, voltemos um pouquinho no
tempo. Em abril de 2012, o chefão do PT convidou o ministro Gilmar
Mendes para um bate-papo. Ele queria adiar a todo custo o início do
julgamento do mensalão. Achando que tinha uma carta na manga contra o
ministro — carta falsa, diga-se —, tentou nada mais nada menos do que
chantagear um membro da corte suprema do país.
Reproduzo em azul trecho de reportagem da VEJA de maio de 2012:
(…)
Depois de algumas amenidades, Lula foi ao ponto que lhe interessava: “É inconveniente julgar esse processo agora”. O argumento do ex-presidente foi que seria mais correto esperar passar as eleições municipais de outubro deste ano e só depois julgar a ação que tanto preocupa o PT, partido que tem o objetivo declarado de conquistar 1.000 prefeituras nas urnas.
Reproduzo em azul trecho de reportagem da VEJA de maio de 2012:
(…)
Depois de algumas amenidades, Lula foi ao ponto que lhe interessava: “É inconveniente julgar esse processo agora”. O argumento do ex-presidente foi que seria mais correto esperar passar as eleições municipais de outubro deste ano e só depois julgar a ação que tanto preocupa o PT, partido que tem o objetivo declarado de conquistar 1.000 prefeituras nas urnas.
Para espíritos mais sensíveis, Lula já teria sido indecoroso simplesmente por sugerir a um ministro do STF o adiamento de julgamento do interesse de seu partido. Mas vá lá. Até aí, estaria tudo dentro do entendimento mais amplo do que seja uma ação republicana. Mas o ex-presidente cruzaria a fina linha que divide um encontro desse tipo entre uma conversa aceitável e um evidente constrangimento.
Depois de
afirmar que detém o controle político da CPI do Cachoeira, Lula
magnanimamente, ofereceu proteção ao ministro Gilmar Mendes, dizendo que
ele não teria motivo para preocupação com as investigações. O recado
foi decodificado. Se Gilmar aceitasse ajudar os mensaleiros, ele seria
blindado na CPI. (…) “Fiquei perplexo com o comportamento e as
insinuações despropositadas do presidente Lula”, disse Gilmar Mendes a
VEJA. O ministro defende a realização do julgamento neste semestre para
evitar a prescrição dos crimes.
Retomo
Lula havia recebido a falsa informação de que Mendes teria relações com Carlinhos Cachoeira. Como se tratava de uma mentira inventada pela rede suja na Internet, seu esforço indecoroso caiu no vazio, e Mendes denunciou a tentativa de chantagem.
Com
Barbosa, a relação passou a ser de ódio explícito. O chefão do PT não
cansou de repetir nos bastidores que Barbosa devia a ele a sua nomeação;
que só havia um negro da corte porque ele tomara essa decisão política.
Esperava, em suma, para citar uma expressão do ministro Marco Aurélio,
que o ministro lhe fosse grato com a toga. Eis
Lula: ele não entende a democracia como a institucionalização de
papéis. Seu mundo é o da troca de favores; do toma-lá-dá-cá; das
relações viciosas que se amparam, se complementam e se justificam.
De resto,
ninguém precisa ser muito bidu para supor que Lula certamente considera
que agiram com correção os ministros Roberto Barroso e Teori Zavascki,
por exemplo, que absolveram José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoino
do crime de quadrilha. E que errados estavam todos aqueles que
condenaram os companheiros.
Em
síntese, para Lula, quando um ministro absolve um amigo seu e condena um
adversário, está agindo tecnicamente; se faz o contrário, então está
movido por má-fé política.
Compreendo
essa alma pura. Nestes dias que seguem, Lula deve é estar de olho no
Vaticano. Está tentando entender por que cargas d’água Padre Anchieta,
João 23 e João Paulo 2º foram canonizados, e ele, Lula, por enquanto,
não foi ainda nem beatificado.
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