Jilmar
Tatto, o secretário de Transportes da cidade de São Paulo, é um homem
historicamente ligado ao setor. Ligado até demais. E já circularam
informações de que essa ligação pode não ser exatamente virtuosa. Já
chego lá. Nesta terça, diante do caos promovido por motoristas e
cobradores em greve, que fecharam 15 terminais na cidade, levando a
mobilidade ao colapso, ele resolveu achar um culpado. Sabem quem? A
PM!!! Numa de suas declarações infelizes, acusou “passividade” da
corporação. O que será que Tatto queria? Que os policiais militares
assumissem pessoalmente a condução dos ônibus?
Afirmou o secretário:
“Acionamos a Polícia Militar para que ela cumpra uma decisão judicial de que, todas as vezes que tiver obstrução do ônibus, por se tratar de um serviço essencial, que ela possa agir. O que não pode é um serviço essencial ser paralisado sem avisar o usuário. De manhã, todos foram trabalhar usando o transporte público, e o usuário da cidade de São Paulo é muito dependente do transporte sobre pneus, e, durante o dia, foram surpreendidos sem ônibus para voltar para casa.”
A
secretaria de Segurança Pública emitiu uma nota oficial em que responde
com a devida dureza às críticas de Tatto. Leiam a íntegra. Volto em
seguida.
Ainda que não tivesse sido, o secretário deveria saber que não interessa à opinião pública jogar sobre os cidadãos ou sobre outras esferas de governo uma responsabilidade que lhe é exclusiva.
Suas declarações sobre a ação da polícia estadual em uma greve municipal são um escárnio. Não existe autoridade com maior proximidade com a complexa interação entre os transportes coletivos convencional e alternativo do que o Sr. Secretário Jilmar Tatto.
Basta ao secretário, considerando sua experiência no assunto, fazer o seu trabalho, que é o de negociar. A Polícia Militar de São Paulo trabalha em conjunto com o prefeito Fernando Haddad, com quem tem uma excelente relação, sempre que acionada e dentro de suas atribuições.
Se
ainda valesse, a liminar mencionada pelo secretário Jilmar Tatto não
tinha como objeto obrigar policiais, que nem habilitação compatível para
dirigir ônibus possuem, a conduzir os coletivos para desobstruir as
vias.
Na ocasião, a liminar foi concedida para que as manifestações de
rua não obstruíssem a circulação dos ônibus. A solução legal, óbvia e
legítima tem que vir da autoridade de trânsito — do qual o secretário
Jilmar Tatto é chefe —, por meio de guinchos e motoristas ou servidores
que possam remover os ônibus.
A Polícia Militar reforçou o policiamento
nos terminais e locais de grande concentração de pessoas, inclusive para
garantir o trabalho de remoção."
Secretaria da Segurança Pública
Retomo
Resposta muito bem dada, não é? Afinal,
terei eu de lembrar que Jilmar Tatto tem dois aliados importantes que
são, digamos assim, ligados à área de transporte? Um é o deputado
estadual Luiz Moura, um ex-presidiário que não cumpriu os 12 anos a que
estava condenado porque se tornou um fugitivo. Hoje, é deputado petista.
Outro é Senival Moura, vereador, também do partido, irmão de Luiz.
O agora
deputado estadual se fez líder dos perueiros, uma área que a família
Tatto conhece muito bem. Sempre me lembro de uma reportagem publicada
pela VEJA em junho de 2006. Segue em azul. E paro por aqui. Por
enquanto. Suspeito, no entanto, que esse assunto ainda vai render.
*
Sempre se soube que uma das
principais fontes de renda do PCC, organização criminosa formada por
presos e ex-presos das cadeias paulistas, era o mercado de lotações – ou
de peruas, como são genericamente chamados os microônibus e as vans que
circulam por São Paulo como uma alternativa ao transporte público
coletivo. O PCC não só domina parte das linhas do sistema como também
extorque cooperativas que, sem ligação com ele, operam no setor.
Há três
semanas, a polícia prendeu Luiz Carlos Efigênio Pacheco, presidente da
Cooper Pam, uma das principais cooperativas de perueiros da capital
paulista, suspeita de ligação com a organização criminosa. Conhecido
como “Pandora”, o perueiro é acusado de ter financiado, com dinheiro de
lotações, uma tentativa frustrada de resgate de preso de uma cadeia de
Santo André (região do ABC paulista), em março passado.
Detido, ele
negou pertencer ao crime organizado, mas admitiu a infiltração do PCC no
setor perueiro e disse que foi por ordem de Jilmar Tatto, ex-secretário
de Transportes da prefeita Marta Suplicy, que sua cooperativa
incorporou integrantes da organização criminosa. As duas afirmações,
graves, constam do depoimento que Pandora deu formalmente à polícia. Uma
terceira informação, porém, ainda mais grave, ficou de fora do
inquérito.
Ela foi dada por Pandora ao delegado Marcelo Fortunato, que o
prendeu. Segundo disse o presidente da Cooper Pam, o ex-secretário de
Marta recebeu 500.000 reais para favorecer um grupo de perueiros ligados
ao PCC no processo de licitação para a exploração da região sul da
capital. Tatto, candidato a deputado federal pelo PT, teve a prisão
preventiva pedida pelo delegado, mas a Justiça ainda não apreciou o
pedido. Pandora foi solto na quinta-feira (15), depois de passar dez
dias preso.
Ele
e Jilmar Tatto são velhos amigos – conhecem-se desde a infância. O
perueiro, que nasceu em uma favela do bairro de Capela do Socorro
(região sul da capital), costumava jogar bola com Tatto e seus irmãos,
que moravam no mesmo bairro. Adultos, os dois mantiveram a amizade. A
nomeação de Tatto como secretário de Transportes da gestão Marta
coincidiu com a ascensão de Pandora no mercado perueiro. Ele, que
começou trabalhando como motorista em Guarulhos, tornou-se uma liderança
no setor. O padrão de vida que ostenta hoje faz supor que ser
presidente de cooperativa de perueiros é um negocião. Pandora dirige um
Golf blindado, anda acompanhado por cinco seguranças e mora em um
condomínio de luxo à beira da Represa de Guarapiranga, equipado com um
intricado sistema de segurança, dois campos de futebol, três quadras
poliesportivas e lagos para pesca e prática de esportes náuticos. Era lá
que, antes de ser preso, ele e Tatto jogavam peladas e faziam
churrascos nos fins de semana.
Até
a gestão de Celso Pitta, os perueiros rodavam clandestinamente em São
Paulo. Foram legalizados na administração de Marta Suplicy. Na ocasião,
os motoristas interessados em trabalhar de forma oficial foram
orientados a se organizar em consórcios. A prefeitura dividiu a cidade
em oito regiões e coube a Tatto, então secretário de Transportes,
coordenar o processo de licitação que distribuiu os lotes.
Foi pouco
antes disso que o PCC se infiltrou no setor. Presos recém-saídos da
cadeia viram no mercado de lotações uma alternativa de trabalho
promissora. A notícia de que surgia, nas periferias da cidade, um
comércio com alto giro de dinheiro vivo logo chegou aos presídios. De
lá, integrantes do PCC passaram a associar-se a líderes das
cooperativas. Hoje, a organização criminosa está presente em linhas que
cobrem, principalmente, as regiões sul e leste da capital.
Na
semana passada, por meio de nota distribuída à imprensa, Jilmar Tatto
negou que tenha envolvimento com o PCC ou com cooperativas ligadas ao
crime organizado. Para ele, seu pedido de prisão tem “cunho político”.
Homem de confiança de Marta Suplicy, Tatto foi também secretário de
Abastecimento, de Implementação de Subprefeituras e de Governo da
ex-prefeita. Seria o seu coordenador de campanha caso Marta tivesse
obtido o apoio do partido para disputar o governo de São Paulo. Jilmar
Tatto é o penúltimo filho de uma família de dez irmãos – cinco dos quais
têm ou tiveram cargos importantes no PT.
Arselino Tatto, um dos mais
velhos, também foi peça-chave para a administração de Marta em São
Paulo. Ele presidiu a Câmara dos Vereadores em 2003 e 2004 e foi,
juntamente com Jilmar, responsável pelos acordos feitos com vereadores
para a votação de projetos prioritários para a gestão da petista (aquela
que, suspeita o Ministério Público, inaugurou a moda do mensalão –
distribuição de propina em troca de apoio político).
Juntos, Arselino e
Jilmar Tatto também respondem por quinze acusações de fraudes e
irregularidades administrativas, todas igualmente sob investigação no
Ministério Público.
Ao
ser solto, no último dia 15, Pandora, cabisbaixo, disse aos policiais
ter certeza de que será morto pelo PCC. Seria queima de arquivo. Ele é
peça fundamental na investigação que se inicia agora e que representa o
primeiro passo para abrir a milionária caixa-preta que é o mercado de
lotações de São Paulo, cujo faturamento anual chega a 900 milhões de
reais. Saber até que ponto ele já se tornou uma espécie de braço legal
do PCC – e, sobretudo, quais são as forças que acobertam essa ligação –
será o principal desafio da polícia.
Encerro
Se Tatto perdeu o contato com a área de transportes, talvez possa pedir ajuda aos irmãos Moura. Quem sabe eles conheçam uma turma de bambas que possa contribuir para pôr fim à crise.
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