“(...)
O ódio político não é um sentimento, uma paixão, nem mesmo ódio. É uma pura,
vil, obtusa palavra de ordem.”
Nelson
Rodrigues – Os idiotas da objetividade
Artigo
no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por
Vania L Cintra
Há
uns dez dias, mais ou menos, eu deixava, em minhatrincheira.com.br, um texto intitulado “A vitória da
propaganda”. Nele, eu dizia que
“porões” se transformara “em palavra-ícone,
muitas vezes até chique para ser usada em rodas ‘intelectualizadas’, ... à qual
podem ser atribuídos efeitos mágicos, fazendo-a capaz de substituir vários
parágrafos ou até páginas e páginas de bons argumentos ou fatos... que seduz
aficionados de emoções radicais e roteiros cinematográficos... que hipnotiza
todo mundo ... tão usada, sem se desgastar, que muita gente de pouca idade ou
de pouco siso suporá que, antes de 1988, o País inteiro seria nada mais que uma
cadeia de ‘porões’ interligados, uma ‘rede’ de ‘porões’. A palavra faz a festa.
E embriaga e paralisa todo mundo, física e intelectualmente”.
Em
sua crônica, Josias de Souza, a pretexto de falar de futebol e de
criticar o tenebroso discurso de Lula da Silva e a atual tenebrosa “perversidade
da desconexão entre gastos e prioridades”, pontifica: “Ao injetar política num
evento que deveria ser apenas esportivo, Lula ressuscita outro período
tenebroso da história nacional. Uma fase em que o torcedor torcia com uma ponta
de sentimento de culpa, sabendo que o triunfo da seleção faria a festa do
general de plantão no Planalto. O paradoxo foi levado às fronteiras do
paroxismo em 1970, ano em que o sucesso da seleção de Pelé nos gramados do
México ajudou a ditadura a abafar os gritos que soavam nos porões do Brasil.”
GOOOOOL!!! Chutou do meio do campo e a bola foi parar dentro da
rede! Pronto! Ganhou o dia!
Todo
e qualquer amante do futebol será sempre um torcedor do time de sua
preferência. Nem sempre, mas em geral, o torcedor é um fanático. O fanático é
sempre ridículo porque é irracional. No futebol, não vê erros dos jogadores de
seu time, não vê impedimentos, não vê faltas nem golpes baixos, não vê mão na
bola. Em sua imaginação de torcedor, a bola deve rolar redonda, sem se
desgastar, sempre no campo adversário. Por ser fanático, não percebendo o quão
ridículo é, o torcedor utilizará qualquer argumento sacado do raso de seu
cérebro para mais alimentar o seu fanatismo, fanatismo que traz problemas a ele
mesmo, talvez especialmente problemas emocionais.
No
jogo político, porém, o fanático, além de ridículo, faz danos não apenas a si
próprio como aos demais. Não vê perversidade, não vê mentira, não vê lixo, não
vê manipulação, não vê desonestidade nos argumentos dos arautos da fé de sua
facção. E vai tocando a bola. Por isso foi que Josias de Souza não pôde deixar
de falar nos “porões”. Porque é fanático. E, assim como acontece com os
cronistas esportivos comentando um jogo de futebol, antes, durante ou depois dele,
nem mesmo um bom estilo jornalístico conseguirá esconder seu fanatismo e
evitar-lhe o ridículo.
Exceto
o abismo que separa a seriedade do Governo Médici da farra solta que
caracteriza os Governos Lula/Rousseff, haveria algo a ver entre o primeiro e os
atuais ídolos da arquibancada? Há nada. Absolutamente nada. Quem torceu
envergonhado em 1970, torceu envergonhado porque resolveu torcer envergonhado.
Ou resolveu dizer que torcia envergonhado.
Naquela
Copa, só ouvi aqueles que Nelson Rodrigues tão bem definiu como “cretinos
fundamentais” e como “idiotas da objetividade” afirmando que não torciam pelo
nosso tricampeonato ou que por ele torciam envergonhados – alguns saltaram fora
do País e, lá de fora, amparados pela Anistia Internacional, torceram desavergonhadamente
contra ele e contra nós, outros ficaram treinando como verter lágrimas de
crocodilo para exibi-las quando os “heróis da resistência” retornassem
anistiados, pois quem não chora não mama.
Tenho
que reconhecer, porém, que alguma coisa de muito óbvio e de muito sensato
Josias de Souza conseguiu escrever hoje e com essa alguma coisa concordo em
gênero, número e grau: “Os verdadeiros ‘fantasmas do passado’ são feitos de
oportunismo e empulhação. Os amantes do futebol não merecem semelhante
agressão.”
Falou
e disse!
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