As investigações da Operação Ararath, no estado do Mato Grosso, trazem à luz a fragilidade da máquina pública brasileira, sujeita à descarada tomada dos poderes pelo crime organizado.
Não faz dois anos, o alvo era o governo de Goiás, com a Operação Monte
Carlo. Outros quatro anos antes, caso emblemático levava para as páginas
policiais o Executivo, o Legislativo e até o Judiciário do Espírito
Santo. ...
Nem se contam os tantos escândalos de corrupção que ora pipocam aqui,
ora ali, da instância federal à municipal. Não é de fatos isolados que
se fala, de um ou outro corrupto flagrado com a mão na botija, numa
rotina repulsiva: é de esquemas ainda mais repugnantes, pela
sofisticação e complexidade, com tentáculos permeando toda a
administração.
O que se vê agora em Mato Grosso é exemplo típico de infiltração da
bandidagem. Ressalve-se, de antemão, que a Polícia Federal não concluiu
as apurações, que seguem sob sigilo. Mas o realizado já estarrece. As
apreensões chegaram à sala de promotor de Justiça encarregado de
investigar o crime organizado no estado. Passaram pelo gabinete do
prefeito da capital. Houve buscas no apartamento do governador. Aliás,
nem um conselheiro do Tribunal de Contas estadual nem o antecessor dele
escaparam do procedimento.
Não bastasse, um dos investigados é senador da República licenciado. Um
ex-presidente da Assembleia Legislativa, cargo que alternava com o de
primeiro-secretário da Casa — mesmo respondendo a uma centena de ações
civis e criminais —, foi preso. Também para detrás das grades foi
mandado um ex-secretário da Fazenda e da Casa Civil.
São perceptíveis a dimensão e a duração do esquema, que envolveria pelo
menos 59 pessoas, entre físicas e jurídicas, e teria movimentado em
torno de meio bilhão de reais ao longo de seis anos. A primeiríssima
providência é dar todo o respaldo à Polícia Federal para desbaratar de
vez a máfia e pôr um a um na cadeia. Mas não só.
O pouco já elucidado ou que as operações revelaram na forma de fortes
indícios é suficiente para a abertura de sério debate na sociedade sobre
os instrumentos de controle e proteção do erário. O Brasil tem pecado
pela tolerância excessiva com esse estado de coisas. O arsenal jurídico
até é aperfeiçoado, como a tardia responsabilização de pessoas jurídicas
pela prática de atos lesivos à administração pública, apenas adotada a
partir de agosto do ano passado.
Mas pouco ou nada adianta aprimorar leis e aumentar penas se o enredo
das histórias continuar a ter a impunidade como capítulo final. Tampouco
resolve o cidadão manifestar repulsa e reeleger políticos pra lá de
suspeitos, livres de ter a ficha suja porque o esquema tem meios de
postergar, senão impedir, a condenação. O eleitor precisa acordar para a
necessidade urgente de passar este país a limpo. A hora é esta.
Fonte: Correio Braziliense - 23/05/2014 - - 00:21:17 BLOG do SOMBRA
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