Mídia Sem Mascara
| 29 Maio 2014
Artigos - Cultura
Medidas
coercivas que visam à redistribuição de riqueza farão apenas com que os
espertos e os politicamente bem-relacionados enviem sua riqueza para o
exterior ao passo que os desafortunados terão de arcar com o fardo do
inevitável declínio econômico.
Gostaria muito de saber quem foi a primeira pessoa a proferir essa máxima. Ela certamente está entre as maiores verdades de todos os tempos, uma que é ao mesmo tempo simples e repleta de profundos significados.
A
igualdade perante a lei — por exemplo, ser julgado inocente ou culpado
baseando-se exclusivamente em você ter cometido o crime, e não em sua
cor, gênero ou crença — é um ideal nobre ao qual nenhuma pessoa de bom
senso se opõe. Por isso, não é o tema deste artigo. A "igualdade" a que a
frase acima se refere está relacionada à renda econômica e à riqueza
material.
Colocando
de outra maneira, portanto, a frase pode ser lida da seguinte forma:
"Pessoas livres terão rendas distintas. Em arranjos nos quais as pessoas
têm obrigatoriamente a mesma renda, elas não podem ser livres".
A
igualdade econômica em uma sociedade livre é uma miragem com a qual os
redistributivistas sonham — e frequentemente se mostraram muito
dispostos a derramar sangue para implantá-la.
A
questão é que indivíduos livres são indivíduos intrinsecamente
diferentes entre si, de modo que não deveria ser surpresa nenhuma o fato
de que eles terão rendas distintas. Nossos talentos e nossas
capacidades não são idênticos. Nem todos nós trabalhamos com o mesmo
afinco, com a mesma dedicação e com a mesma qualidade. Cada um de nós
nasceu em famílias distintas, sendo que cada família possui suas
vantagens e suas desvantagens. Também nascemos em diferentes
vizinhanças, somos cercados por diferentes tipos de pessoas, recebemos
diferentes tipos de incentivos e temos diferentes graus de oportunidade.
É
até compreensível que, perante esse ponto de partida desigual, os
progressistas queiram remediar a situação implantando políticas
governamentais "corretivas". O que eles realmente não entendem é que a
cura que eles propõem é muito pior do que doença. Qualquer tentativa de
corrigir desequilíbrios nas famílias e nas vizinhanças irá gerar outras
desigualdades que podem ser piores do que as originais.
Thomas
Sowell certa vez disse que "Tentativas de se equalizar os resultados
econômicos geram desigualdades maiores e mais perigosas de poder
político". Ou, como concluiu Milton Friedman, "Uma sociedade que coloca a
igualdade à frente da liberdade terminará sem as duas. O uso da força
para alcançar a igualdade irá destruir a liberdade, e a força,
introduzida com bons propósitos, irá terminar nas mãos de pessoas que
irão utilizá-la para promover seus próprios interesses".
Ademais,
mesmo se todos nós, magicamente e subitamente, passássemos a ter a
mesma riqueza, já no dia seguinte voltaríamos a ser desiguais, pois
alguns iriam gastar seu dinheiro e outros iriam poupá-lo.
Em
uma economia de mercado, rendas distintas sempre serão uma realidade. E
tem de ser assim. Essa diferença de renda ocorrerá em decorrência de
fenômenos tão distintos quanto incontroláveis, como talento nato,
ambição, energia, disposição, saúde, sorte, percepção correta quanto às
demandas do consumidor, parceria com as pessoas corretas etc. Sendo
assim, a igualdade econômica só poderá ser tentada (mas nunca alcançada)
por meio de monstruosas e contínuas agressões empreendidas por
funcionários do governo. O resultado mais provável será uma igualdade de
miséria (muito embora os membros da elite política serão mais iguais do
que o resto do povo). Igualdade a um nível decente de prosperidade é
algo que está muito além da capacidade do estado, como bem ilustram Cuba
e Coréia do Norte.
Para
produzir uma mínima quantidade de igualdade econômica, os governos
teriam de expedir as seguintes ordens (e estar disposto a impingi-las
com pelotões de fuzilamento e agentes carcerários): "Não se sobressaia,
não trabalhe com mais afinco do que seu vizinho, não tenha boas e novas
ideias, não corra nenhum risco, e não faça nada de diferente em relação
ao que você já fez ontem".
Em outras palavras, não seja humano.
Pessoas
obcecadas com igualdade econômica — ou, para empregar um termo mais
clínico, com o igualitarismo — tendem a fazer coisas estranhas. Elas se
tornam invejosas. Elas passam a cobiçar o que é dos outros. Elas dividem
a sociedade em dois grupos: vilões e vítimas. Elas gastam mais tempo e
energia tentando derrubar e destruir uma pessoa bem sucedida do que se
esforçando para se aprimorar, para se tornar uma pessoa melhor e, com
isso, subir na vida. São pessoas ressentidas e rancorosas, e não é nada
divertido estar perto delas. Quando tais pessoas eventualmente conseguem
chegar ao poder, os estragos que elas fazem podem ser irreversíveis.
Elas não mais apenas chamam a polícia; elas passam a ser a polícia.
Se
a desigualdade econômica é uma opressão, punir o esforço, o mérito e o
sucesso não é uma cura. Medidas coercivas que visam à redistribuição de
riqueza farão apenas com que os espertos e os politicamente
bem-relacionados enviem sua riqueza para o exterior ao passo que os
desafortunados terão de arcar com o fardo do inevitável declínio
econômico. Uma medida muito mais produtiva seria reduzir o imenso e
burocrático aparato governamental — que, com suas regulações que impedem
a livre concorrência, com sua inflação que destrói o poder de compra,
com suas tarifas de importação que proíbem a aquisição de produtos bons e
baratos do exterior — faz com que os pobres se perpetuem nessa
condição.
Por
outro lado, é fato que há algumas formas de desigualdade econômica
condenáveis. Por exemplo, a desigualdade produzida por um capitalismo
mercantilista, no qual o estado — por meio de agências reguladoras,
tarifas de importação e subsídios — protege os grandes empresários,
certamente é indesejável. Por isso, é importante fazermos uma distinção
entre empreendedores econômicos e empreendedores políticos. Os primeiros
criam valor para a sociedade; ao passo que os últimos simplesmente
descobriram como transferir recursos de terceiros para seus próprios
bolsos.
Em
vez de apenas confiscar a riqueza dos mercantilistas — uma medida
inócua que manteria intacto todo o aparato de redistribuição dos pobres
para os ricos —, muito mais sensato seria abolir todos os arranjos que
permitem o corporativismo, o que levaria à imediata bancarrota desses
mercantilistas. Curiosamente, os progressistas de hoje parecem não se
importar muito com esse arranjo.
Quando
fazemos essa distinção entre mercantilistas e genuínos empreendedores, é
possível ver a diferença entre produtores e parasitas. A desigualdade
oriunda do empreendedorismo honesto, longe de indicar que algo está
errado, significa que há um progresso generalizado na economia. Em um
sistema no qual todos melhoram sua situação por meio da atividade
criativa e das trocas voluntárias, algumas pessoas inevitavelmente irão
se tornar ricas. Trata-se de uma característica natural do sistema — um
sistema que recompensa empreendedores e investidores por terem sido bons
administradores do capital.
Obviamente,
quando tais pessoas não se mostram bons administradores do capital,
elas quebram. Em outras palavras, pessoas que fazem investimentos ruins
ou que não servem bem aos consumidores não permanecerão ricas por muito
tempo — a menos que o governo decida intervir para salvá-las.
A
menos que ela tenha enriquecido contratando advogados e lobistas em vez
de pesquisadores e criadores, uma pessoa rica enriqueceu porque criou
bens e serviços valiosos para seus consumidores. Sendo assim, a ausência
de pessoas muito ricas é um péssimo sinal em uma economia,
especialmente para os pobres. Tal ausência, com efeito, indicaria uma
das duas coisas a seguir: ou muito pouca coisa de valor foi criada
(dificilmente haveria coisas boas e gostosas, como iPhones e trufas) ou o
governo incorreu em uma predatória política de redistribuição de renda,
destruindo os incentivos para as pessoas serem criadoras de valor e
boas gestoras de capital.
No
que mais, vale a pena enfatizar que diferenças na propriedade de ativos
não significam uma igual diferença no padrão de vida, muito embora
várias pessoas tenham esse fetiche. Por exemplo, a riqueza de Bill Gates
de ser 100.000 vezes maior do que a minha. Mas será que ele ingere
100.000 vezes mais calorias, proteínas, carboidratos e gordura saturada
do que eu? Será que as refeições dele são 100.000 vezes mais saborosas
que as minhas? Será que seus filhos são 100.000 vezes mais cultos que os
meus? Será que ele pode viajar para a Europa ou para a Ásia 100.000
vezes mais rápido ou mais seguro? Será que ele pode viver 100.000 vezes
mais do que eu?
O
capitalismo que gerou essa desigualdade é o mesmo que hoje permite com
que boa parte do mundo possa viver com uma qualidade de vida muito
melhor que a dos reis de antigamente. Hoje vivemos em condições melhores
do que praticamente qualquer pessoa do século XVIII.
Sempre
que você vir ou ouvir uma pessoa parolando sobre desigualdade, faça a
si mesmo a seguinte pergunta: será que ela está genuinamente preocupada
com os pobres ou está apenas indignada com os ricos? Eis uma maneira de
descobrir a diferença: sempre que alguém reclamar sobre a desigualdade
de renda, pergunte a ela se aceitaria que os ricos ficassem ainda mais
ricos se isso, no entanto, significasse condições de vida melhores para
os mais pobres. Se a resposta for "não", então ela está admitindo que
está importunada apenas com o que os ricos têm, e não com o que os
pobres não têm. Já se a resposta for "sim", então a tal desigualdade de
renda é irrelevante. Em outras palavras, a preocupação deveria ser com a
pobreza absoluta, e não com a pobreza relativa.
Em
quase todas as discussões sobre desigualdade de renda, há uma básica
dinâmica emocional atuando. Uma pessoa descobre que possui menos do que a
outra, e passa ter a inveja. Já outra descobre que tem mais do que o
resto, e passa se sentir culpada. Inveja, culpa e indignação. São
realmente essas emoções primitivas que deveriam conduzir as políticas
públicas?
Toda
essa ideia de igualdade econômica não representa nenhuma genuína forma
de compaixão. Quando é somente uma ideia, é fraca. Quando se torna
política pública, torna-se um desastre em larga escala.
O
fato de que pessoas livres não são iguais em termos econômicos não deve
ser lamentado. Ao contrário, é motivo de regozijo. A desigualdade
econômica, quando oriunda da interação voluntária de indivíduos
criativos, e não de conexões políticas, é um testemunho do fato de que
as pessoas estão sendo elas mesmas, cada qual colocando seus talentos e
aptidões ímpares para funcionar de maneiras que são gratificantes para
elas próprias e que geram bens e serviços valiosos para terceiros. Como
diriam os franceses em um contexto mais diferenciado, Vive la difference!
Lawrence W. Reed é o presidente da Foundation for Economic Education.
Publicado no site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.
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