A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e as organizações
indígenas e indigenistas, abaixo assinadas, se pronunciam publicamente
afirmando que não participarão das audiências públicas convocadas pela
Comissão Especial da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000 da
Câmara Federal.
A proposta tem a intenção de transferir para o
Congresso Nacional a competência de demarcar as terras indígenas,
usurpando uma prerrogativa constitucional do Poder Executivo.
Pretende
ainda atribuir ao Legislativo a titulação de terras quilombolas e a
criação de unidades de conservação ambiental.
Tomamos
esta decisão por entendermos que:
1. Os povos indígenas e suas
organizações demonstram há anos, país afora, contrariedade à PEC 215/00,
chegando a ocupar, no mês de abril de 2013, o plenário da Câmara
Federal;
2. Mobilizados no período de26 a 29 de maio de 2014 em
Brasília, os povos indígenas mais uma vez tornaram público seu repúdio e
reivindicaram do Presidente da Câmara Henrique Alves a não aprovação da
PEC 215, que se comprometeu a não levar a votação a iniciativa enquanto
não houver consenso.
3. Ainda em 2013, sob pressão da mobilização de
abril, o Presidente Alves criou uma Grupo de Trabalho Paritário formado
por parlamentares e indígenas que emitiu relatório contra a PEC 215,
considerada reiteradas vezes inconstitucional;
4. O ministro Luís
Roberto Barroso, do STF, por ocasião de mandado de segurança impetrado
pela Frente Parlamentar de Apoio aos Povos Indígenas deu parecer
atestando a inconstitucionalidade da proposta;
5. O Ministério Público
Federal também se pronunciou reafirmando a inconstitucionalidade da PEC
215; 6. Juristas, articulistas da imprensa, intelectuais, organizações e
movimentos sociais, associações de profissões diversas, ambientalistas e
quilombolas rechaçaram rotundamente a proposta.
Dessa
forma, os povos indígenas e seus aliados já explicitaram há muito tempo o
seu ponto de vista, pela rejeição da PEC 215/00, não só porque ela
afeta uma regra jurídica fundamental: a divisão dos poderes, mas
sobretudo porque busca suprimir o direito originário dos povos indígenas
sobre suas terras tradicionais reconhecido pela Constituição Federal de
1988.
Denunciamos,
assim, que tais audiências respondem ainda às agendas eleitorais da
bancada ruralista, que fazem delas palco de incitação ao ódio, à
violência, o racismo e a discriminação contra os povos indígenas e
outros segmentos da população como os quilombolas e os sem terra.
Por
elas os parlamentares ruralistas tentam transformar a luta de um grupo
minoritário de latifundiários contra demarcação das terras indígenas em
plataforma política. Nas audiências, tão logo destilam ódio e
informações mentirosas para pequenos agricultores e à população do
entorno dos territórios indígenas, gerando um clima de angústia,
insegurança e medo, tais deputados se apresentam como defensores dos
direitos destes agricultores no Congresso Nacional.
Seguimos
com opinião contrária à PEC 215/00, assim como o STF, a PGR, o
Executivo, setores do próprio Legislativo e da população
brasileira, enquanto os autores e beneficiados pela proposta seguem a
defendendo, visando unicamente seus interesses particulares.
Inadmissível é vermos parlamentares manipulando um instrumento
constitucional de diálogo com o intuito de subtrair do procedimento
democrático seu real fim e legitimar junto a sociedade o monólogo
autoritário de quem sempre apostou no arbítrio.
Não podemos participar deste ataque aos direitos indígenas e à Constituição.
Brasília – DF, 04 de junho de 2014.
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME
Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul – ARPINSUL
Comissão Guarani Yvyrupa – CGY
Articulação dos Povos Indígenas da Região Sudeste – ARPINSUDESTE
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Conselho dos Povos Indígenas de Mato Grosso do Sul
Grande Assembléia Guarani – Aty Guasu
Centro de Trabalho Indigenista – CTI
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Greenpeace
Instituto Socioambiental – ISA
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