terça-feira, 18 de março de 2014

O que fazer se a maioria for apenas de 51% e estiver gritantemente errada?



RENATO RIELLA

No mês em que o Brasil debate os 50 anos da última ditadura, ninguém percebeu que a democracia, como regime e como estilo de vida, acabou. A vontade da maioria tem sido fator de crise em muitos países.

O pior é que a humanidade não conseguiu evoluir para outro modelo – nem está discutindo isso.

Vemos hoje em muitos nações a população dividida, com sangue. Blocos relativamente equivalentes enfrentam-se sem trégua. É o caso da Venezuela, da Síria, do Egito, da Crimeia, da Ucrânia e de muitas outras nações.

No caso do Egito, por exemplo, os muçulmanos poderão eleger um novo governo, se houver eleição. E aí haverá guerra civil. Na Venezuela, também, o voto divide a população de forma sangrenta, sem que surja um poder moderador.

A Síria, em guerra civil, nunca terá paz, mesmo que haja a tentativa de se implantar um regime dito democrático, com eleições. Isso porque o ódio divide a sociedade de forma assustadora. Vejam só o Iraque, onde a toda hora morrem 30, 50, 100 pessoas em atentados urbanos. 

Na Argentina, a presença de Cristina Kirchner na presidência é a prova de que o regime democrático faliu. Valendo-se de expedientes populistas baixos, ela conseguiu herdar o poder oriundo do marido e está levando o país para o buraco.

O fundamento único da democracia é o voto, a vontade da maioria. Mas o que fazer se a maioria for apenas de 51% e estiver gritantemente errada?

Vamos viver situação semelhante no Brasil, este ano. A presidente Dilma Rousseff tem tudo para vencer a eleição presidencial em primeiro turno, valendo-se da maioria de votos nas classes mais dependentes do governo. 

E como fica a outra metade do país, de consciência política mais elevada e maior visão crítica da realidade?

Não temos respostas. Há 200 anos, mais de 600 mil americanos morreram para que um regime democrático exemplar fosse implantado, influenciando outras nações ocidentais.

Vemos, no entanto, que mesmo nos Estados Unidos consolida-se uma luta de classes que em algum momento poderá assustar o mundo.

A democracia já acabou. Não existe maioria se o país estiver dividido em duas forças semelhantes. E se essas duas forças forem conflitantes, como dividir a nação ao meio? 

Não existe maioria, também, se uma minoria estiver sendo sacrificada, disposta a morrer para defender seus direitos.

Na Ucrânia, a Rússia tenta fazer um regime na raça, desmembrando a Crimeia. Certamente vai gerar graves conflitos internos e talvez externos.

O mundo, sem respostas, vê a democracia se esvair em todos os continentes. E as eleições ocorrem a cada momento com maior ausência de público nas urnas.

O Brasil, que comemora a redemocratização do país, ocorrida há 30 anos, pergunta-se: que democracia é esta que aprofundou a concentração de renda e gerou privilégios cada vez maiores?

Que democracia é esta, na qual o Poder Executivo consegue dominar as votações no Supremo Tribunal Federal?

Como exercer os preceitos democráticos se um projeto de lei dispensável e polêmico (Lei Geral da Internet) tranca a pauta da Câmara Federal desde o ano passado? Este projeto foi enviado pelo governo, maquiavelicamente, em regime de urgência, para travar o Congresso em ano eleitoral.

A Venezuela é o grande laboratório da democracia em crise. Qualquer dos lados que ficar no poder vai inviabilizar esse país. E o que o mundo pode fazer? Como deixar um país tão forte se esvair?

Deve haver algum grupo de sábios disponível para discutir uma nova democracia.

O modelo brasileiro tem, pelo menos, um fundamento nobre: aqui a liberdade de expressão e de manifestação ainda é total. Mas até quando? 

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