Após a suspensão judicial da aprovação do Plano de Preservação do Conjunto Urbanístico de Brasília – PPCUB - o alvo da pressão agora se volta para a Lei de Uso e Ocupação do Solo do DF, a LUOS.
Trata-se de outro extenso e complexo documento técnico que abrange todo o Distrito Federal, à exceção da área tombada, a qual é tratada pelo PPCUB. A LUOS traz as regras para ocupação de todas as cidades do DF, definindo assim os usos permitidos, alturas, afastamentos e outros parâmetros urbanísticos que dizem como as cidades devem funcionar, quais áreas serão adensadas, com mais prédios, mais população, mais trânsito, que áreas serão ocupadas ou preservadas, entre outros.
As alterações que estão sendo propostas
para as cidades do DF afetarão a toda a população e, mais uma vez,
carecem de debates mais aprofundados. Diversas questões e conflitos do
projeto de lei não estão esclarecidos, demonstrando que o documento não
está em condições de ser aprovado com transparência e responsabilidade
que a população do DF exige.
No entanto há diversas notícias indicando
movimentações na Câmara Legislativa do Distrito Federal para que esse
Projeto de Lei seja votado nos próximos dias, quando as atenções da
mídia e da população estão voltadas para a Copa do Mundo.
Diante do exposto, a Comissão de
Políticas Urbanas do Instituto de Arquitetos do Brasil no Distrito
Federal – IAB DF promoveu discussões desde o início do ano com a
participação de diversos representantes da sociedade civil e vem a
público se manifestar sobre o assunto, conforme segue:
IAB DF faz crítica ao Projeto de Lei da LUOS – Lei de Uso e Ocupação do Solo do DF.
O Instituto de Arquitetos do Brasil,
Departamento do Distrito Federal – IAB-DF, por meio de sua Comissão de
Políticas Urbanas, instalada em março deste ano, elaborou este documento
que visa oferecer aos arquitetos e demais interessados da sociedade
civil, governo e poder legislativo do Distrito Federal, um conjunto de
referências críticas que possam contribuir com a qualificação e
aprimoramento dos instrumentos e da legislação de planejamento urbano e
territorial do DF. Com isto, espera-se fomentar o debate com vistas à
construção de um debate com efetiva participação popular da sociedade
civil organizada a respeito desse projeto de lei:
- A lógica geral de elaboração da LUOS careceu de uma base de dados
multidisciplinares, bem como de pesquisas a respeito das ações e
dispositivos implantados pelos Planos Diretores Locais e pelo Estatuto
da Cidade – Lei Federal 10.257/01, a fim de embasar um planejamento
global e regionalizado do território do DF, o que evidenciou problemas
oriundos do PDOT;
- Os pontos positivos a serem destacados são o fato de a LUOS ter
estabelecido os conteúdos mínimos na forma de parâmetros urbanísticos
básicos para todas as regiões administrativas e núcleos urbanos do DF, à
exceção da área tombada, contribuindo, à luz do que preconiza o
Estatuto da Cidade, para definir como a propriedade urbana particular
cumprirá sua função social; e ter buscado atribuir unidade a um conjunto
de regras e normativas, urbanísticas e edilícias, construído ao longo
dos anos de maneira confusa e disperso em inúmeros documentos.
- Entretanto, os vácuos e lacunas do planejamento e ausência de clara
articulação entre as UPT – Unidades de Planejamento Territorial,
estabelecidas no PDOT vigente – os PDL (os Planos Diretores Locais e os
Planos de Desenvolvimento Local, ainda não elaborados) e a LUOS, criam
incompatibilidades e incongruências entre estes instrumentos e a gestão
urbanística e edilícia;
- A expectativa em torno da LUOS era de evitar superposição e se
integrar, como instrumento de gestão, ao arcabouço de instrumentos de
planejamento territorial e urbano do DF. No entanto, a LUOS invalida os
Planos Diretores Locais (PDL), pois seu papel e hierarquia no contexto
de planejamento territorial e urbano do DF não estão suficientemente
claros, assim como não está garantida a necessária coerência entre os
diversos instrumentos, em face da fragmentação dos processos de
elaboração, concomitantes e isolados entre si. Como exemplo, a interface
e interferência nas jurisdições entre a LUOS e a área de entorno do
PPCUB, e as legislações de concessão de espaço público e a cobrança de
suas outorgas;
- Há que se apontar a necessidade de visão metropolitana e regional do
planejamento que atente, dentre outros aspectos, para o eixo da BR-060
como vetor de expansão e sua articulação territorial. Essa perspectiva
metropolitana de planejamento não comparece nem em conceito e menos
ainda de forma aplicada na LUOS;
- O caso das Regiões Administrativas do Gama e do Guará é dos mais
ilustrativos dos problemas de compatibilidade e coerência entre os
instrumentos de planejamento e gestão urbana no DF, embora não sejam os
únicos. Esses Planos Diretores Locais propiciaram em anos recentes
impactos significativos na dinâmica viária e ambiental da cidade com a
promoção de adensamentos em locais inadequados e não planejados ou
projetados inicialmente com tais concepções. Há sérias possibilidades de
que a concepção e proposição da LUOS para o Gama, em lugar de
solucionar, agravem os problemas da cidade, muitos dos quais causados
por seu próprio PDL;
- As categorias de uso misto do solo apresentam-se de tal maneira
complexificadas que acabam por gerar grandes dificuldades de
interpretação e aplicação. Provavelmente irão gerar confusões em sua
aplicação, sobretudo em processos participativos, demandando, portanto,
processos de reavaliação de forma pragmática e responsável em vista de
viabilizar sua operacionalidade na gestão urbana;
- O uso do solo tem profundo impacto na mobilidade urbana. A LUOS, entretanto, desconsidera sua responsabilidade na questão, e pouco versa, ou pior, corrobora o aumento do uso do automóvel individual, na medida que não coloca restrições a sua ocupação no interior dos lotes e na transformação do espaço público em estacionamentos. Propostas mais contemporâneas estabelecem número máximo de vagas permitidas no interior do lote, ao invés de número mínimo, que gera enormes impactos ambientais na ocupação do solo e subsolo, cria graves problemas na aprovação de projetos, e por fim, onera toda a sociedade pela solução do transporte particular, retardando e reforçando a omissão do Estado no fornecimento de transporte público.
O IAB-DF, por meio de sua Comissão de Políticas Urbanas, vem a público manifestar sua preocupação com o procedimento adotado para sua aprovação, mais uma vez açodado e marcada pelo calendário eleitoral, discutido de forma difusa e sem a necessária convocação da sociedade civil organizada para se debruçar intensa e longamente sobre o tema, de forma organizada, produtiva e responsável. Um projeto dessa envergadura deve virar uma grande agenda pública, com debate intenso em todos os meios de interface entre sociedade e governo.
A Comissão de Políticas Urbanas do IAB-DF
Junho de 2014
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