24/06/2014
às 6:45
Há muito
tempo, talvez há muitos anos, a imprensa brasileira não publicava uma
informação tão importante como a que está na Folha de hoje e foi tornada
pública ontem à tarde, quando a Folha Online a colocou no ar. Gilberto
Carvalho, secretário-geral da Presidência, esteve no ninho dos black
blocs. Ele próprio contou isso à repórter Natuza Nery.
Na segunda, o
jornal trouxe uma entrevista com o chefão petista — na prática, o mais
poderoso no PT depois de Lula. Ele dizia que os xingamentos e vaias a
Dilma não partiram só da elite branca de São Paulo — claro que não!
Mas
aí não havia novidade. Repetia a uma jornalista séria o que já havia
dito a gente cuja seriedade é regulada pelo caixa.
A revelação de que
esteve com os black blocs? Bem, esta, sim, é inédita. E, segundo os meus
valores ao menos — e, creio, os de milhões de pessoas —, escandalosa e
imoral. Nota-se, no entanto, por sua fala, que ele parece se orgulhar de
seu feito. Sua percepção indecorosa da realidade está em cada palavra,
em cada linha, em cada detalhe.
O que
Carvalho queria com a turma do quebra-quebra? Segundo ele, conversar
para fazer um “diagnóstico”. Ah, bom. O ministro se refere ao grupo
segundo o jargão dos baderneiros, chamando-os de “partidários da tática
‘black bloc’”. Tática? Quem tem tática tem também uma estratégia.
O
método dos arruaceiros é quebrar tudo. O objetivo, eles já deixaram
claro, é mudar o poder. Logo, Carvalho está admitindo, por imposição da
lógica, que ele reconhece a prática como legítima, embora diga discordar
dela. E o faz em tom professoral.
Nas reuniões com os mascarados — que
certamente estavam de cara limpa quando falaram com o ministro —, o
petista tentou convencê-los de que a violência só os isolava.
Coitadinhos! O professor Carvalho queria ser didático.
Mais grave
do que isso: na entrevista à Folha, o ministro dá mostras de
condescender com os motivos dos black blocs, Diz ele que a tal tática “tem
a convicção de uma violência praticada pelo Estado através das omissões
nos serviços públicos e denuncia muito a violência policial na
periferia, com aquela história de que, na periferia, as balas não são de
borracha, são metálicas e letais. E que a única forma de reagir contra
essa violência é também com a violência, que eles dizem que não é contra
pessoas, mas contra símbolos e objetivos. Por isso escolhem bancos e
concessionárias de carros importados”.
Leiam o texto da
Folha. O ministro diz discordar, mas, em nenhum momento, critica
frontalmente a bandidagem mascarada. Então vamos ver. O MTST invade o
que lhe dá na telha e faz ameaças explícitas à ordem.
O ministro
conversa com eles. O MST, nós já vimos, faz sangrar 30 policiais num
dia, e, no outro, lá estão seus representantes com Dilma. O próprio
Carvalho compareceu a um evento do grupo. Índios partem para a porrada
em Brasília e ferem um policial com flecha, mas, claro!, lá está o
intrépido Carvalho para bater um papo.
Nesses
casos, é evidente que temos supostos movimentos sociais a aderir a
práticas definidas na lei como crimes. Mas, vá lá, há ao menos o véu
diáfano da hipocrisia, como diria Eça de Queirós, a arranjar uma
desculpa: são movimentos sociais, cujas lideranças podem ser
identificadas.
Mas e os black blocs? O que são essas pessoas senão
criminosas, que saem por aí a depredar bens públicos e privados? Para
falar com essas pessoas, Carvalho teve de, necessariamente, negociar com
bandidos. Um dos mais altos cargos da República, sob o pretexto de
manter o diálogo com a sociedade e ansioso para acalmar as ruas, foi se
meter no covil de baderneiros.
E obteve
como resposta o quê? Segundo ele diz, um sonoro “não” e a promessa de
que os crimes continuariam. Com que outros marginais este senhor
pretende ainda negociar? Pergunta óbvia: alguém que sai quebrando tudo
por aí em nome de uma suposta ideologia é diferente de quem o faz apenas
por gosto pessoal e paixão pelo vandalismo? Para os que tiveram seus
direitos agravados, que diferença faz?
Carvalho não gosta de mim
Carvalho lidera o coro dos que não gostam
de mim no Planalto, razão por que fui parar na lista negra do PT, junto
com outros oito jornalistas. Não dou a mínima. Não precisa gostar. Não
sou doce de coco. De resto, esse governo não costuma conquistar o amor dos jornalistas. Manda comprar. Ou, então, atua para intimidar. Não
sirvo nem para uma coisa nem para outra. Não gosta por causa de coisas
como esta aqui, atenção! O senhor ministro cometeu crime de
responsabilidade. Existe uma lei que trata do assunto. É a 1.079, de 10 de abril de 1950. Qualquer cidadão pode denunciá-lo.
É crime de
responsabilidade, por exemplo, “violar patentemente qualquer direito ou
garantia individual constante do art. 141 da Constituição e os direitos
sociais assegurados no artigo 157”.
Está na Alínea 9 do Artigo 7º da
lei. Mais: as alíneas 4, 5 e 7 do Artigo 8º definem como crimes de
responsabilidade praticar ou concorrer para que se perpetre qualquer dos
crimes contra a segurança interna, definidos na legislação penal; não
dar as providências de sua competência para impedir ou frustrar a
execução desses crimes; permitir, de forma expressa ou tácita, a
infração de lei federal de ordem pública.
E,
lamento, a meu juízo, Carvalho fez tudo isso. Não só o seu governo — mas
aí o crime não é dele, ou só dele ao menos — nada fez para combater os
black blocs como, ele o confessa, negociou com eles. E ainda foi
malsucedido. Segundo seu próprio testemunho, um dos vagabundos jogou um
rolo de papel higiênico praticamente na sua cara: “Isso aqui é o
ingresso de vocês para a Copa”. Carvalho diz ter reagido “numa boa”.
Ora, é este mesmo senhor que se espanta quando um coro vaia e xinga
Dilma no estádio? Aí o seu partido decide fazer lista negra de
jornalistas supostamente responsáveis pelas ofensas e nos acusa de
adversários da Copa? Quando é que Gilberto Carvalho vai se fantasiar de
black bloc, como Caetano Veloso fez, metendo um pano preto na cabeça?
Indiretamente,
o sr. Gilberto Carvalho infringiu, como ministro de Estado, a Alínea 9
do Artigo 7º da Lei de Responsabilidade. De maneira direta, explícita e
deliberada, infringiu as alíneas 4,5 e 7 do Artigo 8º. Ele esteve num
cara a cara com os promotores da desordem. Nada fez na hora, além de
levar o papel higiênico na cara, nem depois. Ou fez: como sabemos, ele
foi a pessoa que mais se opôs a que se votasse uma lei para combater
essa canalha.
A lei
faculta que qualquer cidadão possa apresentar denúncia ao Congresso.
Vejam nos artigos 14 a 18 as formalidades. Atenção, caros! Essa Lei
1.079 é justamente aquela que foi usada para afastar da Presidência da
República o sr. Fernando Collor de Mello.
Para
encerrar: um dos encontros do sr. Gilberto Carvalho com black blocs se
deu em São Paulo. Enquanto os policiais militares, pais de família, eram
alvos da bandidagem, sendo atacados, ainda que de modo oblíquo, pelo
governo federal, o secretário-geral da Presidência batia um papinho com
os delinquentes.
Não há
delírio nenhum no que estou escrevendo e conversei antes com advogados
que conhecem o riscado: Gilberto Carvalho dá motivos para ser acusado de
crime de responsabilidade. Se condenado, sem prejuízo de ação penal,
perde o cargo e os direitos políticos por cinco anos. A simples
aceitação da acusação já o obrigaria a se afastar. Quem se interessar
tem de ser rápido.
O Artigo 15 da lei estabelece: “A denúncia só poderá
ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por qualquer motivo,
deixado definitivamente o cargo”. Em princípio, ele fica no cargo até
dezembro.
Nenhum comentário:
Postar um comentário