A Petrobras trabalhou com um orçamento sigiloso de
contratação de serviços e equipamentos para a Refinaria de Abreu e Lima, em
Pernambuco.
Várias vezes o Tribunal de Contas da União (TCU) pediu as
estimativas de custos, mas só começou a receber a documentação anos depois do
início das obras.
A empresa ocultou, também, os estudos de viabilidade
econômica, técnica e ambiental do empreendimento, cujos gastos foram
multiplicados por nove nos últimos onze anos: o orçamento inicial de US$ 2,3
bilhões passou a US$ 18,5 bilhões e poderá chegar a US$ 20,1 bilhões até a
inauguração, marcada para novembro, conforme projeções da estatal.
O tribunal começou a fazer auditorias rotineiras em Abreu e
Lima em 2008. Quando localizava indícios de erros ou sobrepreços, solicitava à
Petrobras documentação complementar, sobretudo as estimativas de custos
(“referências de precificação”) nas quais ela teria se baseado para realizar as
contrações.
“Sigilo” foi a alegação mais frequente da estatal para não
entregar documentos, principalmente quando o TCU passou a cobrar os estudos de
viabilidade. Eles contêm os cálculos de custos e projeções de receita do
empreendimento. No caso de Abreu e Lima, isso inclui previsões de despesas com
a construção e montagem dos dutos que ligam a refinaria ao Porto de Suape, por
onde vai escoar a produção de derivados do petróleo.
PETROBRAS ALEGA ‘DIVERGÊNCIAS’
A Petrobras evitou repassar até análises de impacto
ambiental da refinaria, localizada a 35 quilômetros de Recife, em área próxima
do litoral e recortada por cinco rios. As negativas não se limitaram à obra em
Pernambuco. Estenderam-se a empreendimentos no Rio de Janeiro (Comperj), no
Ceará e no Maranhão.
Em 2011, houve uma crise nas relações da estatal com seus
fiscais. Auditores entenderam que havia uma deliberada obstrução ao trabalho do
tribunal.
Listaram indícios de sobrepreços, relataram a existência de
“metodologias inadequadas para definição de viabilidade”, alinharam
deficiências no projeto básico e citaram “contratações diretas e antieconômicas”.
Sugeriram que o então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, fosse
autuado por “sonegação de documento”.
A situação foi contornada com diplomacia pelo TCU. Gabrielli
aceitou acordo para entrega dos documentos ocultados por anos. Não cumpriu, segundo
o tribunal. Na época, o ministro Ubiratan Aguiar escreveu: “Não há evidência de
que orçamento sigiloso aumenta a competitividade”. Acrescentou: “A opção da
Petrobras em manter o absoluto sigilo de suas estimativas de custo (referências
de precificação), antes do lançamento das licitações e após o seu encerramento,
não tem amparo no ordenamento jurídico vigente.”
Um ano depois, em 2012, quando Graça Foster já estava no
comando da empresa, fez-se novo acordo. Gabrielli se livrou das sanções, e a
documentação chegou ao tribunal.
Em nota, a Petrobras explicou que até 2012 “havia uma
divergência de entendimento” com o TCU “sobre o que exatamente deveria ser
entregue e como deveriam ser entregues as estimativas de custos e os estudos de
viabilidade técnica e econômica, bem como uma divergência sobre os aspectos de
confidencialidade”. As divergências acabaram, completou, “e foi definido, por
consenso, um termo de confidencialidade e um procedimento (o que e como) de
encaminhamento destas informações. A partir daí, sempre que solicitado pelo
TCU, a Petrobras passou a entregar os documentos dentro dos prazos requeridos
por aquele órgão de controle”.
No tribunal, os ministros fizeram questão de deixar
registrado em ata: “Apesar do decurso de pouco mais de dois anos entre a
primeira requisição dos EVTEs (estudos de viabilidade) das obras da refinaria e
a efetiva entrega da documentação, em 14 de junho de 2012, há que se constatar
o cumprimento do determinado. A estatal considerava que não deveria submeter a
esta Corte documentos, sob a alegação de sigilo”.
Abreu e Lima se tornou um dos mais caros projetos da
indústria mundial de petróleo: vai gastar US$ 87 mil por cada barril de
petróleo que refinar, mais que o dobro da média internacional. A escalada de
aumento nos seus custos (mais de 770% em dólares) motiva múltiplas
investigações. Um delas se desenvolve no Congresso, onde se prevê para amanhã
um depoimento de Gabrielli, ex-presidente da empresa. Outras duas ocorrem em
Pernambuco e no Paraná. Foram iniciadas por procuradores federais, que se
reuniram na última quarta-feira, em Brasília, com auditores do TCU numa
tentativa de união de esforços.
MAIS FUNCIONÁRIOS SOB SUSPEITA
O inquérito pernambucano se concentra em contratos feitos
pela Petrobras para obras e equipamentos da refinaria, sobre os quais paira a
suspeita de superfaturamento de até US$ 478 milhões. No Paraná, o foco é a
lavagem do dinheiro supostamente obtido na cobrança de “comissões”, sob
intermediação político-partidária, entre a estatal e fornecedores. Não se
conhecem detalhes sobre a nova etapa dessa investigação.
Na denúncia aceita
pela Justiça em abril, que motivou a prisão do ex-diretor de Abastecimento da
Petrobras e ex-presidente do Conselho de Administração da Refinaria Abreu e
Lima, Paulo Roberto Costa, procuradores escreveram: “eventual participação de
outros funcionários do escalão superior dessa empresa estatal será investigada
oportunamente”. O Globo
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