Correio Braziliense 8.04.2014
TASSO AZEVEDO - Consultor para Floresta e Clima, foi
diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro
O alerta não veio de uma ONG ou de ativistas
socioambientais, mas do presidente do Banco Mundial, o coreano-americano Jim
Yong Kim: se não conseguirmos mudar nossa atitude em relação às mudanças
climáticas, em menos de uma década o mundo estará imerso em conflitos
relacionados ao acesso à água e a alimentos.
Com essa frase, Jim Yong fez espécie de resumo do
resumo da segunda parte do 5º Relatório de Avaliação sobre as mudanças
climáticas Globais, produzido e divulgado pelo Painel Intergovernamental
sobre mudanças climáticas (IPCC), na última semana de março, em
Yokohama, no Japão.
O foco do trabalho: impactos, vulnerabilidade e adaptação
às mudanças climáticas.
Se a primeira parte do relatório demonstrava que o
aquecimento global sem precedentes é um fato e as emissões de gases de efeito
estufa são a principal causa, a segunda mostra que as alterações do clima
provocadas por esse aquecimento (aumento do nível do mar, acidez dos oceanos
e redução da extensão e da espessura do gelo nos polos) já estão causando
impactos significativos na vida das pessoas e no ambiente natural, tais como
perda de produção agrícola, aceleração da extinção e deslocamento de
espécies, ampliação de danos à infraestrutura e à economia, por extremos de
chuva e seca.
O painel de cientistas alerta ainda para o fato de os
impactos se agravarem, intensificarem e ampliarem nas próximas décadas, caso
não tenhamos sucesso em reduzir drasticamente as emissões de gases de efeito
estufa.
O relatório, com mais de 2 mil páginas, é recheado de exemplos de
impactos relacionados a extremos climáticos recentes, como ondas de calor,
secas, enchentes, ciclones, incêndios florestais, que revelam a
vulnerabilidade e exposição de muitos ecossistemas e da instraestrutura
humana para lidar com a variabilidade climática atual.
Nas últimas décadas, as mudanças climáticas
causaram impactos nos sistemas naturais e aos humanos em todos os continentes
e em todos os oceanos. Em muitas regiões, mudanças na precipitação e no
derretimento da neve e do gelo estão alterando o sistema hidrológico,
afetando a quantidade e a qualidade dos recursos hídricos.
Várias espécies terrestres, aquáticas e marinhas
alteraram sua distribuição geográfica, rotas migratórias, calendário
biológico, abundância e até mesmo sua interação com outras espécies, em
resposta às mudanças do clima. Os fitoplanctons, por exemplo, têm se
deslocado cerda de 400km por década em busca de águas mais frias.
As
principais culturas agrícolas estão sendo impactadas. Os ganhos anuais de
produtividade caíram de 2% para 1% nas últimas duas décadas. Para algumas
culturas, como a do milho, a produtividade já está caindo.
A avaliação dos riscos dos impactos futuros derivados
das mudanças climáticas é a parte mais complexa do relatório.
O risco
de impacto é resultado da interação de três fatores principais: a ameaça em
questão (aumento do nível do mar, seca severa etc.), o grau de exposição do
ambiente ou da população (proximidade ao local da ameaça) e o grau de
vulnerabilidade (acesso a infraestrutura disponível para enfrentar períodos
de seca).
A exposição e a vulnerabilidade não podem ser
alteradas ao longo do tempo, de acordo com as condições econômicas e sociais,
decisões de investimento e até como consequência de conflitos. Embora os
impactos das mudanças climáticas se distribuam por todos os
continentes e oceanos, são justamente as populações mais pobres e menos
desenvolvidas as mais vulneráveis.
A falta de infraestrutura, conhecimento e
investimentos para prever, monitorar, adaptar-se e reagir aos eventos
climáticos extremos e suas consequências coloca em risco as vidas de milhões
de pessoas no planeta, espremidas entre duas opções: adaptar-se ou mudar-se
para outra região.
O 5º Relatório do IPCC é a mais extensa, completa e
profunda revisão do estado da ciência do clima já produzido. Deve ser revisto
e considerado pelos tomadores de decisão nos setores público e privado, para
se estabelecer ações para mitigar as emissões e adaptar atividades, negócios,
infraestrutura e todos os aspectos de nossa vida.
O relatório é categórico ao afirmar que a forma mais
efetiva de reduzir os riscos é evitar o aquecimento, ou, em outras palavras,
reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Ainda que tenhamos
sucesso em reduzir drasticamente as emissões, teremos riscos importantes de
impacto derivados das emissões históricas acumuladas e, portanto, é preciso
gerenciar esses riscos a aumentar a resiliência dos ambientes e da sociedade.
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