A intolerância dos “tolerantes” já foi tema de coluna
minha, e julgo esse um dos assuntos culturais mais relevantes de nossos
tempos.
Por trás da máscara do politicamente correto, uma patota
fascista tenta impor sua visão estreita de mundo, em que o humor não
mais existe ou, se existe, precisa se adaptar aos ditames dos
“oprimidos”, para enaltecer sempre a narrativa de vitimização das
“minorias”.
Professores sofrem bastante com isso. O livro A mancha humana,
do grande escritor americano Philip Roth, transformado em filme com
Anthony Hopkins, mostra como o uso de uma simples expressão ambígua pode
desencadear uma série de mal-entendidos que culminam em uma desgraça.
A
ficção se tornou realidade, e vários professores temem hoje sofrer
retaliação pelo simples uso de um termo que pode ser retirado do
contexto pelos “fascistas do bem”.
Na Folha, hoje, foi publicado um artigo
de dois professores que contam exatamente suas experiências bizarras em
sala de aula, vítimas da patrulha politicamente correta. Dizem eles:
Nós,
professores de ensino médio e pré-vestibular, temos sido, em sala, alvos
das mais pesadas acusações.
Imbuídos de uma espécie de
“neofundamentalismo politicamente correto”, alguns alunos retiram nossas
observações de contexto e as usam como combustível para justificar sua
intransigência, que cresce a cada dia em progressão geométrica de razão
infinita.
Claro,
atitudes machistas, homofóbicas e afins devem ser combatidas. Mas, em
torno dessa causa justa, surgiram patrulhas ideológicas, sempre atentas a
toda possível ação preconceituosa. O olhar do crítico está tão viciado
que busca preconceito, avidamente, onde não há.
[...]
Os
patrulheiros não costumam ser agentes de mudança. São como fiscais de
trânsito, que só multam, mas não colaboram para melhorar o fluxo.
“Descobrem” infrações que nem foram cometidas. Medem cada palavra do
professor, buscando ferozmente uma má intenção que não está ali.
Nessa caça
intensa, os patrulheiros não se dão conta de que ficaram mais agressivos
do que muitos daqueles que imaginam combater. Praticam um preconceito
às avessas. “Eu faço parte de um grupo iluminado que dita as regras e é
bom você me obedecer.” Só que as regras –repetidas “ad nauseam”, sem
reflexão– quase nunca fazem sentido quando avaliado o contexto.
Em seguida, e após casos concretos
relatados, os autores comparam a situação com aquela descrita na
distopia de George Orwell em 1984, quando a novilíngua define
as palavras aceitáveis em busca do pleno controle do pensamento. Os
professores Luís Pereira e Sílvio Pera concluem:
Ao ouvir
certas expressões (o contexto pouco importa), detectam “preconceito” e
atiram contra o inimigo. Os jovens patrulheiros veem maldade em tudo.
Impregnados, eles sim, por preconceitos, desprezam o humor popular, que
muitos professores usam apenas para quebrar a tensão.
Acreditam que só o
“humor inteligente”, isto é, o militante da “causa”, é aceitável.
Jamais aprovariam a comédia nonsense dos mestres ingleses do Monty
Python, pois “não é engajada”.
São movidos
por boas intenções, mas podam, são censores. Transformaram-se naquilo
que dizem abominar. Em nome da tolerância, têm cometido as maiores
intolerâncias.
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