João Valadares
Publicação: 14/07/2014 06:02
César Gualdani, especialista em marketing e e sócio-diretor da Stochos Sports & Entertainment |
Pesquisador e consultor na área de gestão esportiva, marketing e inteligência de informação no futebol, César Gualdani acredita que é preciso demolir o que existe hoje no esporte mais popular do Brasil para tentar, em 15 anos, colher bons resultados.
Em entrevista por telefone ao Correio, o
administrador de empresas que presta consultorias para os principais
clubes brasileiros, a exemplo de Flamengo, São Paulo, Grêmio, Santos e
Palmeiras, ressalta que o governo federal tem um papel fundamental nesta
reconstrução. Desde 1998, ele tenta modificar a cabeça imediatista dos
nossos cartolas. Gualdani defende que qualquer reformulação passa
necessariamente pela abertura da caixa-preta da Confederação Brasileira
de Futebol (CBF).
Como o senhor analisa a tentativa do governo de protagonizar uma reformulação no futebol brasileiro?
Como uma ação extremamente atrasada. É aquela coisa de colocar a tranca depois que a porta é arrombada. Mas, acima de tudo, é válida. Não foi 4 x 1, não foi 5 x 1. O resultado foi 7 x 1. Era justamente o que cabia exatamente para abalar todas as estruturas de cima até lá embaixo e mostrar que algo está errado. Mesmo antes dessa derrota histórica, já havia a necessidade de uma reformulação.
Mas qual o limite da intervenção? Até onde o governo deve ir?
Na verdade, o governo já intervém. Ele tem uma participação política grande. Só que é uma participação de forma inadequada para algo que mexe com entretenimento, com emoção e paixão. Por isso, precisa ser mais bem entendido. Quando a gente olha o futebol em outros países, ele é tratado como algo muito sério, como algo que visa ao retorno. Uma intervenção tem que municiar ou regulamentar de alguma forma práticas de boa gestão dentro do futebol. Práticas de gestão que já existem para grandes empresas, para empresas médias, para pequenas.
Como o senhor analisa a tentativa do governo de protagonizar uma reformulação no futebol brasileiro?
Como uma ação extremamente atrasada. É aquela coisa de colocar a tranca depois que a porta é arrombada. Mas, acima de tudo, é válida. Não foi 4 x 1, não foi 5 x 1. O resultado foi 7 x 1. Era justamente o que cabia exatamente para abalar todas as estruturas de cima até lá embaixo e mostrar que algo está errado. Mesmo antes dessa derrota histórica, já havia a necessidade de uma reformulação.
Mas qual o limite da intervenção? Até onde o governo deve ir?
Na verdade, o governo já intervém. Ele tem uma participação política grande. Só que é uma participação de forma inadequada para algo que mexe com entretenimento, com emoção e paixão. Por isso, precisa ser mais bem entendido. Quando a gente olha o futebol em outros países, ele é tratado como algo muito sério, como algo que visa ao retorno. Uma intervenção tem que municiar ou regulamentar de alguma forma práticas de boa gestão dentro do futebol. Práticas de gestão que já existem para grandes empresas, para empresas médias, para pequenas.
O futebol está
inserido dentro desse contexto. Hoje, você observa uma penetração muito
grande de pessoas que foram alçadas a presidências dos clubes
brasileiros, enfim, com uma qualificação e capacitação muito pequena de
gestão e administração dos negócios. Hoje, existe uma fuga de atletas
muito grande para o exterior. É algo que precisa ser feito em grande
escala com a participação da mídia, empresários, governo, pessoal de
dentro do setor.
Temos uma entidade chamada CBF que, a pretexto de ser um ente privado, não abre a caixa-preta. A entidade utiliza a marca “Brasil”, mas os brasileiros não sabem quanto ela ganha e onde ela gasta. Uma reformulação de verdade não passa por uma maior transparência?
Claro que sim. Sempre. Da mesma forma que se exige uma transparência de empresas em todos os graus, (deve-se exigir) dos clubes a necessidade de publicarem seus balanços . Enfim, acho que seria interessante abrir essa caixa-preta da CBF. Ter transparência não significa devassar contratos que envolvem algum grau de confidencialidade.
Temos uma entidade chamada CBF que, a pretexto de ser um ente privado, não abre a caixa-preta. A entidade utiliza a marca “Brasil”, mas os brasileiros não sabem quanto ela ganha e onde ela gasta. Uma reformulação de verdade não passa por uma maior transparência?
Claro que sim. Sempre. Da mesma forma que se exige uma transparência de empresas em todos os graus, (deve-se exigir) dos clubes a necessidade de publicarem seus balanços . Enfim, acho que seria interessante abrir essa caixa-preta da CBF. Ter transparência não significa devassar contratos que envolvem algum grau de confidencialidade.
É preciso trazer
credibilidade para o futebol. Envolve muito dinheiro? Sim. Mas o que
isso reverte de benefício para toda a cadeia do esporte em si? Você tem o
exemplo da Federação Alemã. Em 2002, depois de perderem a final daquela
Copa para o Brasil, eles passaram a repensar o modelo do futebol.
Criaram academias. Todos os clubes de primeira e segunda divisão eram
obrigados a ter academias para, em seguida, extrair o que tinha de
melhor na juventude com o objetivo de frutificar hoje, 12 anos depois.
O Brasil tem suas peculiaridades no futebol. Sempre esteve amparado em talentos individuais incríveis. A importação de um modelo de sucesso daria necessariamente certo aqui?
Acho que daria certo a gente visitar vários modelos e extrair o que seria mais cabível para o contexto brasileiro. Não acredito que você importar, por exemplo, o modelo alemão para cá, surtiria efeito. Até mesmo porque faz parte da cultura dos países. Há alguns sinais claros dentro do futebol brasileiro que indicam que é preciso mudar. O principal é o de gestão e governança.
Uma reforma de verdade no futebol brasileiro deve começar por onde?
Deve começar por duas frentes. A CBF precisa ser o maior exemplo. A gente precisa muito melhorar a qualidade não só do futebol jogado dentro de campo, mas, sobretudo, as práticas de gestão para esses clubes. Hoje, os principais clubes estão praticamente quebrados. São pouquíssimos que se salvam. Quase todos continuam se endividando para mostrar um resultado de curtíssimo prazo, ou seja, não tem nada mais para pensar que não seja o resultado da quarta-feira e do domingo. Vamos levando, vamos levando. Se ganhar, ganhou; se empatar, empatou; e se perder, perdeu. É assim que o futebol é pensado aqui.
Então a mudança do mecanismo de gestão dos clubes é o ponto zero.
Sim, claro. A gestão precisa ter um plano de metas a serem cumpridas, precisa fair-play financeiro e, o principal de tudo — que foi implodido no passado por questões políticas — a união dos grandes clubes do futebol brasileiro. Se não tiver uma união no sentido de uma gestão forte, principalmente dos clubes que representam durante 300 dias do ano realmente a paixão do torcedor brasileiro, não dará certo qualquer tentativa de reforma. São esses clubes que devem municiar a Seleção Brasileira. A gestão de um clube pode até ser copiada pelo outro. Você trocar boas práticas é essencial.
Existe hoje, no Brasil, algum modelo que pode servir como base para a reformulação geral do futebol no país?
No Brasil, hoje não existe. Há apenas alguns posicionamentos individuais de alguns presidentes, diretores de clubes, que não fazem tantas loucuras quanto outros fazem. São aqueles que não pensam com o fígado. Esses poucos usam mais a razão. São pouquíssimas exceções. Se você quiser saber quem são é só olhar os últimos resultados dentro do campeonato brasileiro. Por exemplo, um Cruzeiro. Dentro do campo, tem tomado algumas decisões interessantes do ponto de vista de estruturação, planejamento e montagem de elenco.
A presidente Dilma Rousseff tem repetido que o Brasil precisa deixar de ser apenas um exportador de craques, mas me parece impossível, hoje, segurar esses valores no país. Há alguma saída?
Hoje é impossível. Não tem como. Defendo que se consiga segurar esses jogadores. Mas hoje é inviável, sobretudo, pelo grande endividamento dos clubes. Precisam vender suas principais estrelas para poder pagar as contas de tudo que eles assumiram ao longo de anos.
E como resolver isso?
Há clubes com dívidas pequenas, mas há outros com dívidas praticamente insolventes. Clubes como o Botafogo, o Fluminense, o Atlético Mineiro têm dívidas altíssimas em relação às receitas previstas.
O governo entraria aí então?
É mais uma tentativa. Acredito que, por um lado, é possível. Mas, ao mesmo tempo, as dívidas têm de ser pagas. É injusto com aqueles clubes que pagaram seus impostos e cumpriram suas obrigações. O Atlético Paranaense, por exemplo, tinha uma dívida pequena até antes da construção do estádio. Acredito que clubes que não cumprirem o que for combinado, levando em consideração uma intervenção do governo, devam ser alçados para outras divisões. Eles precisam cumprir esse tipo de pena e se adequar à nova realidade. Quem não tem condição, não se estabelece.
O Brasil tem suas peculiaridades no futebol. Sempre esteve amparado em talentos individuais incríveis. A importação de um modelo de sucesso daria necessariamente certo aqui?
Acho que daria certo a gente visitar vários modelos e extrair o que seria mais cabível para o contexto brasileiro. Não acredito que você importar, por exemplo, o modelo alemão para cá, surtiria efeito. Até mesmo porque faz parte da cultura dos países. Há alguns sinais claros dentro do futebol brasileiro que indicam que é preciso mudar. O principal é o de gestão e governança.
Uma reforma de verdade no futebol brasileiro deve começar por onde?
Deve começar por duas frentes. A CBF precisa ser o maior exemplo. A gente precisa muito melhorar a qualidade não só do futebol jogado dentro de campo, mas, sobretudo, as práticas de gestão para esses clubes. Hoje, os principais clubes estão praticamente quebrados. São pouquíssimos que se salvam. Quase todos continuam se endividando para mostrar um resultado de curtíssimo prazo, ou seja, não tem nada mais para pensar que não seja o resultado da quarta-feira e do domingo. Vamos levando, vamos levando. Se ganhar, ganhou; se empatar, empatou; e se perder, perdeu. É assim que o futebol é pensado aqui.
Então a mudança do mecanismo de gestão dos clubes é o ponto zero.
Sim, claro. A gestão precisa ter um plano de metas a serem cumpridas, precisa fair-play financeiro e, o principal de tudo — que foi implodido no passado por questões políticas — a união dos grandes clubes do futebol brasileiro. Se não tiver uma união no sentido de uma gestão forte, principalmente dos clubes que representam durante 300 dias do ano realmente a paixão do torcedor brasileiro, não dará certo qualquer tentativa de reforma. São esses clubes que devem municiar a Seleção Brasileira. A gestão de um clube pode até ser copiada pelo outro. Você trocar boas práticas é essencial.
Existe hoje, no Brasil, algum modelo que pode servir como base para a reformulação geral do futebol no país?
No Brasil, hoje não existe. Há apenas alguns posicionamentos individuais de alguns presidentes, diretores de clubes, que não fazem tantas loucuras quanto outros fazem. São aqueles que não pensam com o fígado. Esses poucos usam mais a razão. São pouquíssimas exceções. Se você quiser saber quem são é só olhar os últimos resultados dentro do campeonato brasileiro. Por exemplo, um Cruzeiro. Dentro do campo, tem tomado algumas decisões interessantes do ponto de vista de estruturação, planejamento e montagem de elenco.
A presidente Dilma Rousseff tem repetido que o Brasil precisa deixar de ser apenas um exportador de craques, mas me parece impossível, hoje, segurar esses valores no país. Há alguma saída?
Hoje é impossível. Não tem como. Defendo que se consiga segurar esses jogadores. Mas hoje é inviável, sobretudo, pelo grande endividamento dos clubes. Precisam vender suas principais estrelas para poder pagar as contas de tudo que eles assumiram ao longo de anos.
E como resolver isso?
Há clubes com dívidas pequenas, mas há outros com dívidas praticamente insolventes. Clubes como o Botafogo, o Fluminense, o Atlético Mineiro têm dívidas altíssimas em relação às receitas previstas.
O governo entraria aí então?
É mais uma tentativa. Acredito que, por um lado, é possível. Mas, ao mesmo tempo, as dívidas têm de ser pagas. É injusto com aqueles clubes que pagaram seus impostos e cumpriram suas obrigações. O Atlético Paranaense, por exemplo, tinha uma dívida pequena até antes da construção do estádio. Acredito que clubes que não cumprirem o que for combinado, levando em consideração uma intervenção do governo, devam ser alçados para outras divisões. Eles precisam cumprir esse tipo de pena e se adequar à nova realidade. Quem não tem condição, não se estabelece.
O
governo precisa ser muito duro nesse ponto e não ceder a interesses
políticos. A gente sabe que quem legisla também tem um time do coração e
a gente sabe que existe uma bancada da bola muito forte dentro da
Câmara. Se a gente não tivesse perdido da maneira que perdemos, esse
debate não existiria.
A gente poderia ganhar a Copa e esse modelo velho e
ultrapassado nunca seria questionado. Esse debate só existiu porque
perdemos de 7 x 1. Só por isso. Durante o jogo, eu temia que fosse oito.
Eu já tinha entendido. Tudo o que acontece na vida de alguma forma tem
um lado bom.
O senhor é otimista em relação a esta reforma no futebol brasileiro ou acha que se trata apenas de um debate circunstancial?
Eu sou muito otimista. Tanto é que faço parte de um grupo que se chama Futebol do Futuro. A gente precisa tratar de conceitos que precisam ser desenvolvidos. Temos que deixar de ficar apenas apagando incêndios. Acredito que, se o governo tiver vontade política realmente para demolir o que existe e levantar uma base sólida, a gente pode, num longo prazo, diria que em 10, 12 ou 15 anos, apresentar algo muito consistente no futebol.
O senhor é otimista em relação a esta reforma no futebol brasileiro ou acha que se trata apenas de um debate circunstancial?
Eu sou muito otimista. Tanto é que faço parte de um grupo que se chama Futebol do Futuro. A gente precisa tratar de conceitos que precisam ser desenvolvidos. Temos que deixar de ficar apenas apagando incêndios. Acredito que, se o governo tiver vontade política realmente para demolir o que existe e levantar uma base sólida, a gente pode, num longo prazo, diria que em 10, 12 ou 15 anos, apresentar algo muito consistente no futebol.
Aí sim será possível manter os nossos craques, ter ligas
interessantes, mais justas entre todos os envolvidos na cadeia. O maior
beneficiado disso tudo será a Seleção Brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário