No dia 3 de fevereiro de 2006, os conselheiros e diretores
da Petrobras — entre eles, Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil e
presidente do Conselho de Administração da estatal — ouviram um alerta. Eram
14h20m, e o grupo estava na sede da empresa, no Rio de Janeiro, quando o
conselheiro Fábio Barbosa pediu a palavra e ressaltou a necessidade de aperfeiçoar
os mecanismos para coibir “atos lesivos ao patrimônio da companhia”.
O assunto havia sido discutido nove dias antes, numa reunião
do Comitê de Auditoria, presidido pelo conselheiro, e, na ocasião, ficara
acertado que a Petrobras daria atenção prioritária a órgãos de controle, como a
Controladoria Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU). No
encontro dos conselheiros, eles ouviram o diagnóstico de que a Petrobras tinha
“baixo índice de respostas das diversas áreas para as deficiências nos
controles internos e respectivos planos de remediação”.
No mesmo dia, na mesma reunião e com os mesmos presentes, o
Conselho de Administração aprovou a compra de 50% da refinaria de Pasadena, no
Texas, uma das mais rumorosas transações da Petrobras em gestões petistas. O
empreendimento consumiu mais de US$ 1,25 bilhão somente na aquisição, US$ 685
milhões em investimentos básicos para funcionar e US$ 1,4 bilhão em
empréstimos.
O negócio passou a ser investigado por CGU e TCU,
ironicamente citados na reunião, e também por Polícia Federal (PF), Ministério
Público Federal (MPF) e duas Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) no
Congresso. Mais de oito anos depois daquela reunião e em início de campanha
pela reeleição, a presidente Dilma terá dor de cabeça sobretudo com o processo
que está em curso no TCU.
Os primeiros relatórios técnicos citam a necessidade de
responsabilizar a presidente por supostas irregularidades no negócio. Os
últimos eximem Dilma. Caberá a um ministro de oposição no tribunal, José Jorge,
ex-senador pelo PFL (hoje DEM), dar o encaminhamento que achar válido ao
plenário. As auditorias mais recentes apontam um prejuízo de US$ 620,1 milhões
e pedem que os ex-diretores-executivos restituam este valor aos cofres da
estatal, caso as explicações não sejam convincentes.
Documentos com tarjas
As cinco páginas da ata da reunião de número 1.268 do
Conselho de Administração, obtidas pelo GLOBO, permitem entender como
transcorreram as três horas e 25 minutos do encontro do colegiado da Petrobras
naquele 3 de fevereiro de 2006. A empresa vinha fornecendo aos órgãos de
controle apenas o trecho referente à compra de Pasadena, com tarjas no conteúdo
restante. O ministro-chefe da CGU, Jorge Hage, não concordou com a omissão.
Pediu em ofício e e-mail enviados diretamente à presidente da companhia, Graça
Foster, a retirada das tarjas. E foi atendido.
Dilma presidiu a reunião de 3 de fevereiro de 2006 na
presença de mais cinco conselheiros: Antonio Palocci Filho, Cláudio Haddad,
Fábio Barbosa, Gleuber Vieira e José Sergio Gabrielli, então presidente da
Petrobras. Três conselheiros, “por motivo justificado”, não participaram do
encontro: Arthur Sendas, Jaques Wagner e Jorge Gerdau. Os integrantes da
Diretoria Executiva estavam no encontro, entre eles Nestor Cerveró —
responsável pelo “parecer falho” citado por Dilma como justificativa para a
compra de Pasadena — e Paulo Roberto Costa, preso no Paraná por suspeitas de
desviar recursos públicos empregados na construção da refinaria Abreu e Lima,
em Pernambuco. Ao todo, 13 pessoas estavam na reunião.
Na primeira parte do encontro, houve a apresentação sobre a
necessidade de desenvolver mecanismos para “coibir atos lesivos ao patrimônio
da companhia”. Na segunda parte, foram feitas diferentes apresentações
técnicas: sobre aquisições de novos negócios, estratégias para a Bacia de
Santos e investimentos em gás natural, por exemplo. Coube a um gerente
detalhar, naquele momento, a intenção de comprar uma refinaria de petróleo do
Texas. Em seguida, os conselheiros debateram as apresentações.
Seis itens na pauta
A pauta propriamente dita veio em seguida. Tinha seis itens,
dos quais quatro foram apresentados a pedido de Dilma e dois por solicitação de
Gabrielli. O primeiro informou o tamanho das reservas de petróleo da estatal. O
segundo, “por solicitação da presidente Dilma Vana Rousseff”, tratou da venda
dos direitos minerários de potássio no Amazonas. O Conselho de Administração
autorizou a venda, por meio de uma licitação internacional.
Logo em seguida, também a pedido de Dilma, Gabrielli relatou
ao colegiado a iniciativa de a Petrobras renunciar aos direitos minerários de
barita na Bahia e de areias especiais no Maranhão, o que também foi aprovado. O
quarto item da pauta foi o plano de atividades de auditoria interna para aquele
ano, introduzido na reunião a pedido de Dilma e validado pelos conselheiros.
O quinto e penúltimo ponto foi a compra de 50% da refinaria
de Pasadena. Gabrielli pediu que Cerveró apresentasse a proposta — ele já havia
falado sobre as reservas de petróleo. E os conselheiros aprovaram por
unanimidade o negócio. Por último, Dilma pediu que Gabrielli relatasse a intenção
de compra de duas empresas: a El Paso Rio Claro Ltda. (Macaé Merchant) e a El
Paso Rio Grande Ltda. Dilma encerrou a reunião às 17h45m. (O Globo)
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