A expectativa da inauguração do trecho entre Palmas (TO) e
Anápolis (GO) da ferrovia Norte-Sul pela presidente Dilma Rousseff, na próxima
quinta-feira, provocou intensa agitação no canteiro da obra, na semana passada.
O clima entre trabalhadores e empresários do porto seco da região era uma
mistura de esperança, por ver a instalação dos trilhos 27 anos depois do começo
das obras na ferrovia, espera, e ceticismo.
É que o recebimento de produtos da região Norte até o
coração do cerrado e o escoamento de safra agrícola para os portos de Norte e
Nordeste dependem da definição de quem vai operar esse trecho da Norte-Sul. Em
ano eleitoral, o governo tem pressa em inaugurar a obra, mas só na
segunda-feira passada convocou as empresas interessadas em operar a linha, a
primeira de um novo modelo de uso da malha ainda não testado, que pressupõe
duas figuras independentes: o concessionário da linha e o operador, que fará o
transporte de carga.
— Para usar a linha, preciso saber quem vai operar, qual vai
ser o preço e como será a condição do porto de Itaqui (MA) para receber a minha
carga, porque ele não tem terminais adaptados para receber os meus produtos —
reclamou Sebastião Osmar Albertini, gerente da unidade de Anápolis da Granol,
empresa de produção e comercialização agrícola à beira dos trilhos, com
potencial de escoamento de um milhão de toneladas por ano pela Norte-Sul.
‘Não tem onde conectar’
Albertini não espera tirar da estrada os cerca de 200 mil
caminhões por ano que poderão ser substituídos pelo uso da ferrovia. O terminal
que receberá farelo de soja em Itaqui só deve ficar pronto em novembro, quando
a agroindústria estará em fase de manutenção para receber a próxima safra. Com
a ferrovia ativa, a estimativa é que a partir dos portos do Norte, o frete
marítimo seja reduzido em ao menos quatro mil quilômetros até a América do
Norte e Europa. O empresário também não sabe qual será a solução para suprir o
mercado de vagões no período de escoamento da safra, quando puder usar a
Norte-Sul.
— Este ano, não acredito que tenhamos oportunidade de operar
(na Norte-Sul), porque falta estrutura portuária para receber o produto
acabado, no nosso caso, o farelo de soja, e colocá-lo em navio. Até existe
estrutura hoje (em Itaqui), mas voltada para grãos e não para produto acabado —
previu.
Rodrigo Vilaça, presidente da Associação Nacional dos
Transportadores Ferroviários (ANTF), reforça a avaliação: — Anápolis não está pronta, neste ano não vai ter impacto
nenhum (no volume de carga transportado), não tem pátio intermodal, não tem
onde conectar — disse.
Gastos adicionais de R$ 400 milhões
A entrega do trecho da Norte-Sul entre Palmas e Anápolis foi
prometida para 2010, ainda no governo Lula, e depois incluída em vídeo de
campanha da presidente Dilma, no mesmo ano. A obra teve orçamento inicial de R$
4,28 bilhões, que foi acrescido de cerca de R$ 400 milhões nos últimos anos
para suprir gastos excepcionais, por conta de deficiências no projeto original,
superfaturamentos apontados pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e obras mal
executadas e refeitas. Entre a primeira campanha de Dilma e a que está por vir,
o ex-presidente da estatal Valec José Francisco das Neves, o Juquinha, foi
preso na operação Trem Pagador da Polícia Federal por ocultação e dissimulação
da origem de dinheiro de contratos de trechos da Norte-Sul.
Parte das obras remanescentes, contratadas pela Valec, ainda
deverá ser concluída após a inauguração, como a complementação de taludes
(rampas) de concreto. Segundo a Valec, do total desses contratos que somam R$
400 milhões, R$ 238 milhões já foram efetivamente gastos. As empresas
contratadas também deverão oferecer manutenção em um período imediatamente após
a inauguração, em contratos que vão até fevereiro.
— Para 2015, o trecho a partir de Anápolis estará
funcionando com tudo pronto, levando a próxima safra agrícola — disse Bento
José de Lima, diretor de Operações da Valec. (O Globo)
Nenhum comentário:
Postar um comentário