segunda-feira, 5 de maio de 2014

Campos e as “diferenças” com Aécio. Ou: Sobre a hora de calar e a hora de falar



Eduardo Campos, pré-candidato do PSB: as diferenças e os cuidados
Eduardo Campos, pré-candidato do PSB: as diferenças e os cuidados


Às vezes, o debate fica meio atrapalhado, e cumpre, se me permitem o neologismo, desatrapalhar. 


Neste domingo, o ex-governador de Pernambuco e pré-candidato do PSB à Presidência, Eduardo Campos, resolveu marcar suas diferenças em relação ao tucano Aécio Neves, no encerramento de um encontro promovido pelo Partido Pátria Livre, ex-MR-8, que, depois da redemocratização do país, passou a ser um braço de Orestes Quércia no PMDB. Doente, o ex-governador se retirou da política já no fim de 2008. Morreu em 2010. 

Em 2009, surgia o Pátria Livre. Adiante. Já que o PSB, afinal, se diz “Partido Socialista Brasileiro”, cumpre, quem sabe?, lembrar a Campos o que dizia Mao Tsé-tung sobre a contradição: existem a fundamental e as secundárias. Creio que, hoje, a contradição fundamental do PSB se dá com o PT — e é nessa frente que vale a pena gastar energias. As diferenças com Aécio são secundárias. 

Transformá-las em tema de debate — e fazer digressões a respeito — interessa, vamos ser claros, àqueles que mantêm contradições fundamentais com ambos: os petistas. Pode ser que Campos esteja sendo levado a marcar essas diferenças pelo grupo marinista. Seria o caso de constatar que, até agora, essa aliança não lhe agregou votos. Isso deve querer dizer alguma coisa.

No encontro do tal Pátria Livre, Campos considerou:

“Assumi um compromisso que não se vai fazer mudança no país tirando direito dos trabalhadores. Hoje, o Ministro Mantega fala nisso e o candidato Aécio também já se posicionou em relação a isso. A questão da maioridade penal é outro exemplo. Eu já deixei muito claro que a questão da segurança é muito mais séria que isso. A maioridade penal é uma cláusula pétrea da constituição. O supremo já se posicionou sobre isso, não tem como mudar. Quem está falando que vai mudar isso, não conhece a decisão da suprema corte do país — disse ele, aproveitando para alfinetar o candidato do PSDB que afirmou recentemente apoiar, em casos especiais, a redução da maioridade penal.”


Vamos, então, pôr as coisas no lugar. Comecemos pela questão trabalhista. O tucano Aécio Neves não defendeu “flexibilização” nenhuma. Quando se referiu recentemente ao tema, falava de um setor específico, o de turismo, que vive uma realidade muito particular. De resto, os trabalhadores do setor privado com carteira assinada chegam a 77,1% num universo de 57,3% de pessoas com idade de trabalhar consideradas “ocupadas”. Esses números são do IBGE e se referem ao quarto trimestre do ano passado.


Logo, há de se convir que existem milhões de trabalhadores ainda na informalidade. Aécio não defendeu a flexibilização, mas a proposta deveria ser abraçada por todos os candidatos. A flexibilidade não é sinônimo de precariedade. Alguns setores, com menos encargos e regras menos rígidas, poderiam empregar mais e formalizar mais as relações trabalhistas. Campos fez, portanto, uma síntese ligeira e superficial do tema, atribuindo, de resto, a seu parceiro de oposição, ainda que em outro partido, um opinião que não tem.


No caso da maioridade penal, está duplamente equivocado. A proposta do PSDB, apresentada pelo senador Aloysio Nunes (SP), mantém a maioridade aos 18 anos, mas confere à Justiça, no caso de crimes hediondos, a possibilidade de responsabilizar um criminoso a partir dos 16. De resto, não é verdade que o Supremo Tribunal Federal já tenha se manifestado a respeito. A informação está errada.  A título de ilustração: na sabatina de que participou no Senado, por exemplo, Teori Zavascki opinou que não se trata de cláusula pétrea.


Na sua intervenção, Campos também acusou o governo de fazer terrorismo eleitoral ao sugerir que, se a oposição vencer a eleição, o Bolsa Família vai acabar. Defendeu ainda “uma regra para o preço dos combustíveis, que leve em consideração o preço internacional e também o custo de produção no nosso país”. E emendou: “Quando o governo toma essa posição, o que isso gera? Tira a Petrobras do trilho em que estava porque precisava de gente comprometida que pudesse fazer a blindagem da interferência política. Quando se desrespeita o planejamento estratégico da companhia e deixa a companhia submetida a interesses politiqueiros, tira dela a possibilidade de saber qual é a receita dela e está condenando a empresa a viver o que ela está vivendo.”


Pois é… Se a questão é terrorismo, Campos pode se preparar: os petistas começarão a acusá-lo hoje mesmo de querer elevar o preço dos combustíveis. A política começa a entrar naquele momento em que calar, às vezes, pode ser tão importante como falar.


Por Reinaldo Azevedo

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