Conversas gravadas pela Polícia Federal mostram que Alberto Youssef e Luiz Argôlo, do Solidariedade, tentaram excluir duas empresas de uma concorrência na Bahia, estado do parlamentar.
Argôlo, o deputado: diálogos revelam planos com o doleiro envolvendo licitação, e trazem referência a vinho de R$ 3 mil.
Novos diálogos entre o doleiro Alberto Youssef e o interlocutor
identificado na Operação Lava Jato apenas como LA, que para a Polícia
Federal é o deputado Luiz Argôlo (SDD-BA), revelam uma trama da dupla
com objetivo de evitar que duas empresas participem de uma licitação.
Durante a troca de mensagens, o parlamentar chega a escrever palavrões
quando descobre que uma das companhias furou o plano. “Filhos da…O cara
entrou. Com uma.” Numa das interceptações, registrada no dia 17 de
outubro de 2013, o deputado é taxativo. “Rapaz, vc tem que falar com a
pessoa (Sic). Ele tem q tirar duas empresas do processo que será amanhã
cedo. Se elas participarem, o convênio não será publicado”, avisa...
Ao ser informado pelo doleiro que “elas têm convênio com ele em
Fortaleza”, o deputado justifica o pedido inicial. “Fale mesmo. Se não o
pessoal do outro lado trava.” Nos diálogos, não fica claro onde a
concorrência seria realizada e também quem é “ele”. Apuração do Correio
indica que a licitação ocorreu na Bahia, estado do parlamentar. No dia
18 de outubro, às 8h09, Argôlo encaminha nova mensagem para Youssef. “Os
nomes das empresas são: Eletronor e Cosampa”, avisa. Um minuto depois,
encaminha outro torpedo para avisar a Youssef que o monitoramento está
sendo feito e o plano vai bem. “O pessoal já monitorou e sabe que tem
relação com ele. Se elas derem preço, o pessoal cancela o outro. Resolvi
isso com ele.”
Em outra conversa, registrada no dia 21 de outubro, Argôlo avisa ao
doleiro que está sem dormir e pede que Youssef cheque o contrato. “Quero
que você veja logo com o rapaz do contrato. Você não sabe o quanto de
compromisso”, alerta. Ao ser questionado pelo doleiro o motivo pelo qual
não consegue dormir, o parlamentar responde que “O Roberto não deu mais
nada, tô quase correndo nu na rua”. No relatório da Operação Lava-Jato,
a Polícia Federal não identifica quem é Roberto.
Youssef, o doleiro, é acusado de liderar esquema de lavagem de dinheiro a partir de laboratório de fachada.
Em todos os diálogos interceptados, fica clara a intimidade entre a
dupla. As cobranças e pedidos do parlamentar sugerem que os dois são
sócios em alguns negócios. Às 20h13 do dia 21 de outubro, o político
baiano dá satisfação a Youssef sobre o andamento das negociações.
“Rapaz, tô sentado aqui. O pessoal quer publicar se o pessoal desistir.
Fale com ele. O pessoal tá fazendo a instalação do material dele lá no
Ceará”. O doleiro responde em seguida. “Quem contratou não foi ele e sim
a Secretaria de Estado do Ceará. Não ele”. O deputado implora ao
doleiro. “Ele tem relação o a empresa (Sic). Faça um apelo a ele. Por
favor”. Youssef responde que já fez.
Vinho
No dia 14 de outubro, Argôlo e Youssef trocam mensagens sobre um vinho
de três mil que tinham tomado na noite anterior. “Foi bom o vinho. Valeu
a pena”, escreve Youssef. O deputado pergunta o nome da bebida e o
doleiro informa o valor. “Vega Cicilia (Sic). 3 pila. KKK”, responde.
Trata-se de uma reserva de 1986 do tinto espanhol Vega Sicilia. “KKK
mesmo. Vou voltar para tomar o resto”, diz Argôlo. Mensagens revelam que
o encontro ocorreu provavelmente na casa do doleiro. “Veja logo o
assunto do pessoal para eu poder levar hoje. Não é melhor ir para sua
casa não?”, pergunta o deputado. Youssef responde afirmativamente. “Sim.
Já vamos assim que você chegar.”
Na sexta-feira, o Correio tentou entrar em contato com Luiz Argôlo. A
assessoria de imprensa alegou que ele estava no interior da Bahia em
atividades políticas e, por isso, não havia como responder aos
questionamentos do jornal. A assessoria não quis confirmar se o
parlamentar reconhece ser o LA registrado nos diálogos da PF. Para a
investigação, não há dúvida. Em uma das mensagens encaminhadas ao
doleiro, LA informa o endereço. “302 N, Bloco H, Ap 603”. O bloco H da
quadra 302 Norte é um prédio funcional da Câmara dos Deputados. No
apartamento 603, mora justamente o deputado Luiz Argôlo. O Correio
telefonou para as empresas Eletronor e Cosampa, citadas nas mensagens da
dupla, mas não conseguiu resposta.
Alberto Youssef, preso na Operação Lava-Jato, é apontado como líder de
um esquema de lavagem de dinheiro e evasão de divisas que teria
movimentado R$ 10 bilhões. A organização utilizava empresas de fachada, a
exemplo do laboratório Labogen, para fazer remessas ao exterior.
Troca de mensagens
Confira os novos diálogos
O vinho de 3 mil reais
14/10/2013
LA - Veja logo o assunto do pessoal pra eu poder levar hoje.
Youssef - Estou vendo.
LA - Não é melhor ir pra sua casa não?
Yousseff - Sim. Já vamos assim que você chegar.
LA - Ok.
Youssef - Vamos construindo.
LA - Viajo cedo.
Youssef - Se você precisa ir cedo vá que mando o velho la denoite (SIC)
Youssef - Foi bom o vinho. Valeu a pena.
LA - Foi. Qual foi ele?
Youssef - Vega Cicilia (Sic). 3 pila. KKK.
LA - kkk mesmo. Vou voltar para tomar o resto.
Youssef - Sim.
LA - kkk.
Youssef - Ele ficou satisfeito.
LA - Foi do caralho. Uma relação duradoura, séria e madura.
A jogada para tirar concorrentes da licitação
17/10/2013
LA - Tá acordado?
Youssef - Estou sim.
LA - Rapaz, vc tem que falar com a pessoa. Ele tem q tirar duas
empresas do processo que será amanhã cedo. Se elas participarem, o
convênio não será publicado.
LA - IMPORTANTE
Youssef - Tem certeza que é dele essas empresas?
LA - Elas têm convênio com ele em Fortaleza
Youssef - Vou ligar e falar com ele.
LA - Fale mesmo. Se n o pessoal do outro lado trava.
Youssef – P... eh f... Vou falar sim.
LA - Vai falar ainda? N esquece n será amanhã cedo. São duas do Ceará
Youssef - Já liguei esta fora de área. Vou falar cedinho. Entendido
LA - Fica em cima
Youssef - Sim
A revolta
18/10/2013
LA - O pessoal estão (SIC) aqui no meu escritório. O V fez um acordo pra o nosso rodar. Vc tem q me confirmar.
LA - Os nomes das empresas são: Eletronor e Cosampa. O pessoal já
monitorou e sabe que tem relação com ele, se elas derem preço, o pessoal
cancela o outro. Resolvi isso com ele.
Youssef - Ok
LA- Viu os nomes das empresas?
Youssef - Vi. Já estou falando. Oi. A empresa tá aqui falando que não
tem relação nenhuma com esses nomes. Falando direto com o diretor.
Agora, tentando falar com o irmão do mn para saber. Tá fora de área.
LA - Eles prestam serviço em Fortaleza. Meu comprovante.
Youssef - Estou no médico. Já falo com você.
LA - Filhos das putas. O cara entrou. Com uma.
Youssef - Ele deixou claro que nao eh relacionamento dele. Ele falou com a Cosampa
LA - Só essa foi a que entrou. Foi o contrário. Tá vendo.
Youssef - Vou falar com esse filho da p...
O desespero
21/10/2013
LA - Kd vcccccccccccc??????
Youssef - Estou aqui. Pode me ligar.
LA - Naaaaaaao aguento mais.
Youssef - Somos 2. Me liga
LA - Já. Rapaz, tô sentado aqui o pessoal q publicar se o pessoal
desistir. A instalação veio uma empresa do Ceará q eh ligada a ele.
Youssef - Ele disse que não eh.
LA - Fale com ele. O pessoal tá fazendo a instalação dele lá no Ceará.
Youssef - Quem contratou não foi ele e sim a secretaria de estado do Ceará. Não ele.
LA - Ele tem relação o a empresa. Faça um apelo a ele. Por favor.
Youssef - Já fiz. Ele disse que vem falar comigo na quarta-feira.
LA - Veja isso mesmo para não atrapalhar a nossa vida.
Youssef - Ok.
Dupla tem uma relação estreita
O relacionamento estreito entre o deputado federal Luiz Argôlo (SDD-BA)
e o doleiro Alberto Youssef ameaça inclusive a permanência do
parlamentar no partido. Líder do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva
(SP), o Paulinho da Força, prefere aguardar a investigação da
Corregedoria da Câmara dos Deputados para decidir se toma alguma medida
mais drástica em relação a Argôlo. Nos bastidores, a expulsão do
parlamentar da legenda é dada como certa, mas Paulinho defende que “é
preciso apurar” as denúncias.
A explosão de revelações trazidas pela Operação Lava Jato, deflagrada
pela Polícia Federal em 17 de março, desmascarou um esquema de corrupção
e pagamento de propina que envolve o deputado Luiz Argôlo, identificado
pelas iniciais L.A, e o doleiro. Mensagens interceptadas pela Polícia
Federal às 8h33 do dia 28 de fevereiro deste ano também mostram a troca
de carinho entre eles. Logo cedo, em plena sexta-feira de Carnaval ,
Argôlo envia um torpedo ao amigo dizendo ter “um carinho muito especial”
por ele, que responde com um “idem”.
Em seguida, o deputado reforça que queria ter expressado o carinho no
dia anterior: “mas acabei não falando: te amo”. Na sequência, o doleiro
respondeu: “eu amo você também. Muitoooooooo <3”. Argôlo demonstra
preocupação com saúde do doleiro, que sofreu um infarto no início do
ano. E insiste: “Por favor, me diga alguma coisa”.
Em outra transcrição das interceptações da Polícia Federal, desta vez
de setembro do ano passado, Argôlo e o doleiro conversam sobre uma
“encomenda” a ser entregue no endereço do deputado, no apartamento
funcional da Quadra 302 da Asa Norte. “Tem uns pagamentos para serem
feitos. Posso passar?”, questiona o parlamentar diálogo revelado pela
revista Veja.
O doleiro responde “passa” e o deputado envia, por mensagem, os valores
e as contas para que fossem feitos os depósitos bancários de R$ 13,5
mil para uma loja de decoração, em Salvador, e R$ 40 mil para uma
agropecuária localizada no interior da Bahia, na cidade de Entre Rios,
município de Argôlo.
Em entrevistas anteriores, Argôlo havia negado envolvimento no esquema e
dito que só viu Youssef uma vez em um jantar. Agora, o deputado evita
comentar o assunto. O caso dele é investigado pela Corregedoria da
Câmara dos Deputados a pedido do PPS. Para Rubens Bueno (PR), líder da
sigla, há indícios de que o deputado baiano, que trocou recentemente o
PP pelo recém-criado Solidariedade, quebrou o decoro parlamentar ao
manter relações com o doleiro preso. (NT)
Fonte: JOÃO VALADARES e NAIRA TRINDADE - Correio Braziliense - 05/05/2014
BLOG do SOMBRA
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